Bandeira ao léu (Arquivo JRS) |
Quem não conhece a música Anunciação,
de Alceu Valença? Quem ao escutar a letra dela, não pensa no tempo chamado de
Advento (da espera do nascimento de Jesus numa gruta de Belém) pelas pessoas católicas?
Tu vens, tu vens
Eu já escuto os teus sinais
Tu vens, tu vens
Eu já escuto os teus sinais
A voz do anjo
Sussurrou no meu ouvido
Eu não duvido
Já escuto os teus sinais
Que tu virias
Numa manhã de Domingo
Eu te anuncio
Nos sinos das catedrais…
Tia Maria da Barra, a Tia Iaiá,
morava ao lado do Nhonhô Armiro, numa casa de tijolos bem cuidada e cheia
de flores ao redor, na praia da Fortaleza. Uma carreira de bastoeiros
separava as duas áreas que começavam no jundu. Nós, crianças reinadeiras, passávamos no seu
terreiro regularmente. Ela era dona de um jeito especial para explicar a
doutrina católica. Sempre tínhamos paciência em escutá-la, principalmente pela
motivação de ganhar deliciosas bolachas ao final de seus ensinamentos. Sempre
aprendíamos com ela coisas inimagináveis.
“Advento, crianças, é como se chama este tempo
de dezembro, quando a gente se prepara para comemorar o Natal. São quatro
semanas para marcar em nossas vidas as quatro vindas do Nosso Senhor Jesus
Cristo: na carne, no espírito, na morte e no juízo”. Ela até explicou melhor
cada vinda, mas faz tanto tempo que até deixou de ficar na memória. O que eu
guardei de verdade, desde aquele tempo, foi a justificativa da titia: “O filho de Deus veio ao mundo para consolar
os pobres, curar os enfermos, libertar os cativos e iluminar os ignorantes”. Então, esse tempo chamado de Advento, depois
daquela mensagem da titia, além da expectativa de Cantoria de Reis em nossas
portas na madrugada, se tornou mais uma oportunidade de pensar a nossa ação de
construção de um mundo mais justo; de uma autêntica vida comunitária. Valdemar
Rossi, um militante sindical católico da capital paulista, complementou um dia:
“Se não considerarmos o Advento como
oportunidade revolucionária, seremos hipócritas. Todos que acreditam na
mensagem de Jesus precisam cultivar uma ação política coerente, de libertação”
Gente nossa, igual a saudosa Tia Iaiá, são responsáveis pela tradição da
religiosidade popular tão marcante na nossa cultura caiçara. No Advento
acontece as Cantorias de Reis (Reisado) pelas casas. Acabei de ler que o
Paulinho do Paru, pescador no canto da Prainha do Góis, está inquieto, na espera das bênçãos para a canoa
e a rede. Essa devoção, antes presente em todas as comunidades, se encerra no
Dia dos Santos Reis (seis de janeiro). Depois disso, em outros tempos, as
folias faziam uma cantoria festiva no dia dois de fevereiro, quando se
comemorava a festa de Nossa Senhora das Candeias. Agora já não acontece mais.
Tu vens, tu vens/Eu
já escuto os teus sinais.
Que os teus sinais sejam de esperança. Que teus sinais sejam de
transformação.
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