Casal de foliões (Arquivo K. Setti) |
Impressionante como sagrado e profano estavam caminhando juntos nas cantorias dos antigos caiçaras! Kilza Setti, cuja obra a respeito da nossa musicalidade em Ubatuba vai de meados da década de 1970 até meados da década seguinte, diz que "para o caiçara não importa misturar, ao sagrado, fatos corriqueiros, nem sequer reservar os poderes do milagre para situações mais graves. Utiliza o sobrenatural sempre que está em dificuldades ou sempre que as soluções se configurem como difíceis, uma vez que ele não separa o sobrenatural do natural, mas antes os vê num processo de inter complementação". Com base em quê a estudiosa afirma isso? Muito fácil, oras! Preste atenção na letra da cantoria.
Eu ofereço este bendito, ai
com palavras de oração, ai
O Rosário e o Espírito Santo, ai
Pra nos dá a salvação, ai
Aí, vô dá um gradecimento, ai
Pra tão boa refeição, ai
Ai, nos deram com prazer, ai
Pra nós e c'os folião, ai
Ai, Jesus perguntou, ai
Ai, quem tratô dos folião, ai
Nossa Senhora respondeu, ai
Vossos filho da benção, ai
Ai, a sua sagrada mesa, ai
O Divino partilhou, ai
No meio tem uma cadeira, ai
Onde Cristo se assentou, ai
Eu agradeço a cozinheira, ai
Trabalhando no fogão, ai
Ai, em louvor dessa bandeira, ai
Ai, em roda dos folião, ai
É isso! Está no livro Ubatuba nos cantos das praias, da Kilza, publicado em 1985: "Os versos atestam a familiaridade que permite mesclarem-se Deus e os homens: o sagrado e os elementos do cotidiano".
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