Cadê a senhorinha? (Arquivo JRS) |
Dito Neves era caçador. Raras vezes avistei ele em pescaria, conforme costume de todo mundo naquele tempo. Sua esposa era a Joaninha. Seu filho João era meu companheiro de escola, mas não fazia nenhum esforço para estudar. De vez em quando ganhava reguadas do professor porque se recusava a fazer alguma atividade. Cresceu e foi embora, trabalhar na capital paulista. Pelo que dizem, anos depois foi assassinado na grande metrópole. João do Dito Neves: um caiçara que nunca mais voltou ao nosso chão.
No verão, época do caju, eu sempre passava na casa do João. Dois ou três enormes cajueiros faziam a nossa alegria. Tinha do amarelo e do vermelho. Uma delícia! Numa tarde, estando eu por ali, chegou o pai do João, vindo do mato. Trazia um porco grande e outras caças miúdas. Logo rodeamos ele, pois criança é curiosa e não esconde de ninguém. Um bicho pequeno, do tamanho de uma guaitica, se debatia dentro do saco. Ele pegou nas mãos e nos mostrou: "Eu trouxe este bicho para vocês verem. O nome dele é senhorinha. Deve ser parente da gambá. Reparem que ela também tem uma bolsinha, mas é atrofiada. Só não solta cheiro como gambá. É boa de se comer, mas eu não mato. Esta eu peguei sem querer, parecia sonolenta na trilha. É só para vocês conhecerem, pois quase não se vê mais aqui por perto. Amanhã eu devo soltar ela no mato, ali para cima da casa do Zé da Nhãnhã".
Quase cinquenta anos já se passaram. Nunca mais eu vi senhorinha, uma "cacinha boba" no dizer do finado Dito Neves. Espero que ainda exista desse animal andando pela nossa Mata Atlântica.
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