quinta-feira, 17 de março de 2011

A VITÓRIA FOI DOS PEITOS

    Eu tive um avô de pouca instrução, mas com muita sabedoria. Era José Armiro, da praia da Fortaleza. Apesar de ter falecido há um bom tempo, de vez em quando é inevitável deixar de citá-lo. Suas frases sempre eram certeiras, diziam até coisas que ainda não entendíamos. Hoje eu digo que ele era um pensador, mas daqueles muito reservados, que somente entre os familiares dava os ares da graça. Porém, foi dele que nós (filhos, netos etc.) aprendemos muito “de profano e de sagrado”. Sempre gostei de pescar com ele; eram os melhores momentos, quando contava coisas incríveis. Certa vez, por exemplo, enquanto curricávamos depois da Laje Grande, no alinhamento de fora entre as ilhas do Mar Virado e Anchieta, de onde, num entardecer maravilhoso, enxergávamos perfeitamente a Ilha da Vitória, o vovô veio com algo muito interessante. Foi mais ou menos assim:

            “Aquela é a Ilha da Vitória, menino. Ainda mora bastante gente naquele lugar, mas muita gente já se baldeou para o continente. Foi lá que, recentemente, por volta de 1960, o meu primo Mané Marreta, depois de se tornar protestante, daquela igreja cinzenta do Lázaro, decidiu propagar os princípios da nova crença. Foi remando com mais um companheiro, o seu cunhado Bertolino. Uma linda Bíblia, devidamente embrulhada, seguiu junto num balaio de timbopeva ainda virgem. Chegando lá, depois de puxar a canoa no trapiche, subiu morro acima tirando o chapéu a todos. No alto do morro, onde até hoje ficam as casas dos ilhéus, ele arriou o balaio, desembrulhou o estranho objeto para aquele lugar, onde nunca alguém sequer tinha ouvido falar de livro. Demorou um pouco, mas explicou bem sobre o motivo que o levara ali. Logo estava na pregação propriamente dita: falou do dilúvio, do primeiro homem, da Eva e da tentação. Neste ensinamento acerca das tentações ele se demorou mais. Acho que era porque as mulheres, em todas as épocas, continuam sendo tentadoras, principalmente naquele lugar isolado, onde nem sutiã elas conheciam. Só sei dizer, menino, que o Mané não aguentou continuar pregando as boas-novas e olhando a tais volumes tentadores. Voltou rapidamente para o seu lugar, na Praia Brava”.

            “Depois de um período se martirizando pelas tentações peitudas enfrentadas com pouco sucesso, ele tomou uma decisão: foi até a cidade, comprou um monte de sutiãs, embarcou novamente para a Ilha da Vitória, mas desta vez sua mulher, a Bilia, foi levada junto. O trabalho dela era secundário na tarefa missionária, mas muito importante naquele momento. Logo estava entre as mulheres com as estranhas peças. Ela ensinou...ensinou...ensinou...porém, as ilhoas se embaraçavam, achavam complicado as manobras, além de incomodar muito e de tirar a liberdade. Desistiram da tal moda; a Bilia também entregou os pontos. Para encurtar esta prosa, menino, só sei que o meu primo desistiu de evangelizar a ilha. Foi vencido pela tentação (ou tetação?) mamária. Até hoje ele se lamenta pelo ocorrido. Eu desconfio que naquela época a fé dele ainda era muito fraca” 

            Eu completei:

            - Ou é ele que está menos macho hoje? O vovô riu, balançando a cabeça afirmativamente.


            Depois do causo, concluí sobre o nosso lugar:

A- No início tudo era permitido;  
B- Depois veio a religião católica; 
C- Mais tarde vieram outras religiões; 
D- As tentações principais – aos homens! – continuam vindo das mulheres. Isto prova que o nosso lado instintivo, original, ainda não foi domado totalmente pelas instituições que buscam enquadrar-nos em moldes, em padrões morais castradores.
           
            Sugestão de leitura: A religião dos Tupinambás, de Alfred Métraux.

                                                               Boa leitura!
                             José Ronaldo dos Santos

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