sábado, 26 de março de 2011

Pau cheiroso


                  Em certa ocasião,  na praia  da  Enseada, vindo de uma pescaria com o meu pai, vivi uma oportunidade única:  escutar o velho Henrique, o Fabiano e o Bráulio contarem causos de canoas.
                O velho Henrique, na ocasião, trabalhava na guarita da entrada da praia para impedir que os carros ficassem passeando pela areia, no lagamar; Bráulio Rocha era caseiro de um ricaço, no Canto da Bá; Fabiano fazia canoas. O comum a todos: eram caiçaras, adoravam conversar e sempre estavam combinando pescarias.
                 Meu pai, grande amigo deles, também tinha tais características. Foi ele que começou falando de canoa; disse que ficou impressionado por uma delas na praia do Puruba, cujo nome era Sacrifício, devido o trabalho que deu para trazer de onde foi cortada a timbuíba até chegar no rio da Escorregosa, no sertão do Cambucá, para depois navegar  por toda a baixada do Puruba até o rancho, na boca do rio. Quem quiser conferir tá lá: é a canoa preta repleta de redes. Ao lado dela, no mesmo rancho, tem duas azuis. O finado tio Durval dizia: “São as minhas queridas”.
                Em seguida, o Bráulio, da família Rocha (de muitos contadores de causos), explicou o nome da sua embarcação. Tinha o nome de Meu bem querer por escolha de sua companheira, representando o amor que os unia.
                 O Dito Henrique, já bastante idoso, devia ter inúmeros causos de canoa, mas contou de uma lá da praia da Fortaleza. Tratava-se de uma canoa rombuda, curta e grossa, de capurubu, com um mínimo de acabamento, “feito só no machado” conforme expressão usada nesses casos. Porém, era uma canoa própria para cargas. O nome dela: Cu grande, cujo dono a era o tio Genésio, filho do nhonhô Armiro, “um homem de coração tamanho do mundo”. Por isso que, sempre que alguém tinha uma boa carga, logo dizia: “Vou na Cu grande do Genésio; só ali cabe uma montoeira de coisas”. E ele emprestava prontamente a canoa que mais podia ser chamada de Feiosa, conforme conclui o velho Henrique.
                 Finalmente, o Fabiano, pai do nosso amigo José Carlos Góis, que terminava uma canoa feita de canela-bosta, lá no Morro do Funhanhado, disse:
                - Depois de ouvir vocês me inspirei para dar nome à minha canoa. No mês que vem, por ocasião da pegadeira de peixe-porco, ela romperá a arrebentação das ondas com o nome de Pau cheiroso.
                Todos riram e concordaram que era o nome mais apropriado nesse caso.

                Sugestão de leitura: O chalaça, de José Roberto Torero
                                                                                Boa leitura!
                                                                               José Ronaldo dos Santos

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