quarta-feira, 15 de setembro de 2021

MENSAGENS NAS BADALADAS

Três sinos na torre da Igreja Matriz - Arquivo JRS

        Quando criança, tanto no Sapê, quanto na Fortaleza e no Perequê-mirim, uma forma de comunicação era o sino que se encontrava na capela, num ponto alto do frontão, numa modesta torre. Suas badaladas eram chamadas para as orações, expressões de festividades ou outros eventos significativos às comunidades. O saudoso tio Durval e a estimada tia Belinha diziam que, quando acontecia de um médico estar se aproximando da comunidade, o sino badalava em retinido alongado. Então, quem sofresse alguma doença ou não estivesse bem naquele dia, sabia que o doutor estaria na capela. Quando perguntei como ele alcançava aquela distância, sabendo que a praia do Puruba dista 25 quilômetros do centro da cidade, eles explicaram: "Vinha a pé como todo mundo. Era raro ter barcos naquele tempo. Gente assim mereceria estátua na nossa cidade, nunca poderia cair no esquecimento. Veja agora esse outro médico, o doutor Wilson, o japonês. Quanto ele nos serve? É impressionante a dedicação dele, sobretudo no atendimento das mulheres deste nosso lugar! Só que hoje tem estrada, ele vem de carro. Agora não se puxa mais a corda do sino para aviso assim. Só em dia de missa ou de festa a gente escuta as badaladas. Outro médico que deixou saudades em quem é do nosso tempo, dos mais antigos, foi o doutor Miranda. Ele bebia demais, mas nunca deixava de consultar quem precisasse dele. Depois de receitar algum remédio, ele perguntava se o paciente tinha dinheiro. Caso não tivesse, ele tirava do próprio bolso e entregava para a pessoa. Dizia que não seria por falta de dinheiro que a alguém ficaria sem se curar. É essa gente generosa, que se compadecia dos mais pobres, que nunca haverá de sair da nossa memória e das nossas rezas". 

      Anos atrás, estando na torre da igreja matriz, no centro da cidade de Ubatuba, dando uma modesta contribuição ao documentário do amigo Leandro, me passou pela memória os muitos momentos em que, estivesse onde estivesse, a gente silenciava para ouvir as badaladas e entender sua mensagem. 

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