A bicicleta do Jura (Arquivo JRS) |
Jurandir, acompanhando modas de fora, construiu uma bicicleta nova juntando pedaços de outras: alongou os garfos, fez uma seleta de encosto, esticou o guidão, arrumou uns faróis grandes e pintou de amarelo puxando para ocre. Com uma vela queimando, fez uma manchas pretas pelos canos. No para-lama dianteiro, um passarinho de asas abertas pedia passagem. Ficou diferente e bonita, resultando no comentário do primo João Cabral, um solteirão recém chegado de Santos, onde estivera trabalhando por duas décadas: "A mente humana é capaz de tantas coisas, cria tantas novidade...Depois você me empresta para eu dar umas paqueradas".
Aquela bicicleta era um sucesso em 1970. Seu dono a usava apenas aos domingos, às margens da rodovia para se mostrar aos transeuntes, aos viajantes do trajeto acabado de ser reinaugurado. Logo veio a temporada, com as praias se enchendo de veranistas. Era quando as famílias ricas (da capital e outras cidades grandes) passavam ao menos um mês se deleitando nas praias, se realizando com o imenso mar e comendo bastante peixe fresco.
As férias escolares eram ocasiões de namoros aos jovens caiçaras. Sempre encontravam um jeito de marcar encontros com as empregadas trazidas pelas famílias; criavam oportunidades de namoros que sequer conseguíamos entender como era possível. Muitas dessas moças nunca mais subiram a serra, casaram-se por aqui. Seus descendentes são muitos dessa caiçarada de hoje.
Numa ocasião a sorte sorriu para o já citado João que vivia doido para arrumar uma companheira. Um baile acontecia no "Salão", sede do Esporte Clube Anchieta, denominado de "Cocheira" pela Dona Aparecida, mãe do rapaz da bicicleta. Uma solteirona conversava animada com o João. Depois de duas ou três danças, o casal se dirigiu à praia que era, logo ali, um refúgio dos namorados assim que escurecia. De repente, uma zoeira e uma trombada. Ele foi para um lado e ela para o outro, rolaram sem ainda estar na areia fofa. Jurandir, já chapado de conhaque, surgiu do nada com a bicicleta desgovernada e fez o estrago. Ela, bem machucada, precisou ser atendida às pressas por Joaquim, o enfermeiro. Em seguida, foi levada à casa do patrão. João estava inconformado. Só restou desabafar a raiva no Jurandir com uns tabefes: "Estragaste tudo, seu merda! Ai que raiva de você!". E estragou mesmo! João findou seus dias solteirão, bebendo cachaça como consolo. Eu sentia muita dó dele.
O Jurandir atropelou o futuro do João!
ResponderExcluirPois é. O apelido do João era "num tem pobema".
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