João Paulo, nosso vizinho do Sapê (Arquivo Kilza Setti) |
Ricardo Nunes, o rabequista-artesão, chamava genericamente de violino as rabecas que produzia. Kilza Setti, pesquisadora que nos legou um estudo do caiçara paulista e de sua produção musical (Ubatuba nos Cantos das Praias), escreveu que "o músico caiçara distingue facilmente o violino industrializado daquele feito na região. Dos onze violinos encontrados em Ubatuba, durante sete anos de pesquisa, apenas um era industrializado, comprado em São Paulo. Os demais são de fabricação artesanal local. [Era o ano de 1977]. Apesar de os instrumentos serem todos da mesma procedência [do município], sua fabricação é atribuída a três ou quatro diferentes artesãos. É importante notar que, pela talha, os músicos conhecem qual o artesão autor de cada instrumento". No ano passado, na festa da aldeia Boa Vista, no Prumirim, uma liderança jovem, segurando uma das rabecas da Casa de Reza, me disse todo orgulhoso: "Esta rabeca é muito boa. Foi feita pelo Mário Gato. Você conhece?". Me enchi de orgulho pelo filho da dona Mercedes, aquele jovem que se despertou no terreiro da capela do Itaguá!
Me aproveito do momento para dizer que aquele instrumento industrializado, comprado em São Paulo, era do nosso vizinho João Paulo, companheiro roceiro do vovô Estevan, na praia do Sapê. João Paulo, João Miguel e tio Maneco Armiro eram rabequistas nativos mais ao sul do município. Com certeza, a julgar pelo capricho de sua filha Maria Cruz, esse instrumento que tantas vezes me levou a sentar no terreiro vizinho da minha infância para me encantar, está bem guardado. Durante um tempo esteve emprestado ao primo Antunes, saindo nas Cantorias de Reis, no tempo de Advento.
Agora, para terminar, reconhecendo a importância e agradecendo a esse pessoal novo que está produzindo tantos instrumentos, uma fala do saudoso Mestre Ricardo Nunes apreciando outras rabecas produzidas pelos caiçaras de seu tempo:
"O feitio do Zé do Céu, da Picinguaba é um; esse aí acho que não foi ele que fez, não. Eu acho que esse é daí mesmo, feitio da Barra-Seca, por aí; tô desconfiado que esse aí é o feitio dele [do Vítor, que viveu na Barra-Seca]. Não é do Zé do Céu, não".
Nenhum comentário:
Postar um comentário