Mano Guinho quase alcançando a Pedra do Imbé (Arquivo JRS) |
Em outro texto, dias atrás, expliquei que as minhas crianças, quando eram pequenas, na hora de dormir, pediam sempre Histórias do Zezinho. Então, espremido na cama estreita, buscando palavras, eu criava narrativas com coisas que aconteceram no passado. Muitas vezes usava nomes de gente conhecida como uma forma de homenagem. Os eventos viravam brinquedos porque as palavras são poderosas.
Artelino veio de uma terra distante. De um lugar
onde ninguém da família do Zezinho conhecia. Por isso que ele era também
conhecido como Nortista. Mas o nome dele era Artelino Flor, morava no morro da
praia Brava. As suas prosas sempre tratava de coisas amadas que o tempo lhe havia roubado. Por exemplo: o irmão dele, um ano mais novo, viajou para trabalhar em
São Paulo e nunca mais deu notícias. Foi assim que Zezinho soube-lhe a origem: era
nordestino.
Como o irmão, ele deixou a sua terra; precisava trabalhar, ganhar
dinheiro para poder ajudar a família que era pobre demais. Na cidade grande
logo conseguiu ser empregado. Pouco tempo depois o seu patrão construiu uma
casa na praia e o levou para ser caseiro.
Caseiro é a profissão de quem zela pela casa de
alguém, mora na propriedade, mas separado do casarão, na casa de caseiro. Artelino usou esta
frase para que o Zezinho entendesse melhor: "Eu estou aqui como se
fosse um cão de guarda do patrão. E o Pindá, aquele vira-lata ali, é o meu cão
de guarda de verdade!".
Pindá era um cachorro preto, bem peludo. Zezinho
dizia que era da "raça de cachorro barbudo". Artelino dizia coisas
maravilhosas dele. Um dia segredou que, no barranco, perto da Pedra do Imbé, o
Pindá cavoucara uma coisa que tinha farejado. Era uma caixa enleada com uma
coisa diferente. Assim que o sol bateu nela, aquilo foi se derretendo e a caixa
se abriu. Sabe o que tinha lá dentro? Moedas de ouro! Muitas e de diversos
tamanhos! Emocionado, naquele dia distante, terminou a prosa:
"Hoje, Zezinho, é a derradeira vez que nos vemos. Estou me despedindo só de você porque sei que não vai comentar a respeito disso com ninguém. Vou voltar para a minha cidade, do lugar de onde precisei sair. Estou quase morto de saudade da minha gente, do papai e da mamãe".
Ele se foi naquele mesmo dia, de carona no
caminhão do Getúlio que buscava uma vez por mês banana naquele nosso lugar. Nunca
mais se teve notícias daquele homem. Nunca ninguém soube nadica de nada pela
boca do Zezinho. Só vocês agora estão escutando a história do Artelino Flor. Uma coisa com certeza aconteceu (porque é normal acontecer!): o tempo
levou mais coisas amadas do Artelino. Tenho a convicção de que até ele, depois de tanto tempo, já foi levado. Ser rico ou pobre é indiferente ao
tempo.
Quando eu não dormia antes de acabar a história,
ainda fazia esta pergunta: "E ai, gostaram?".
Gostei. Torço para que ele tenha conseguido realizar seus sonhos e não tenha encontrado nem um espertalhão aproveitador. Valeu amigo irmão.
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