quinta-feira, 1 de outubro de 2020

APETITE DE CAVALO

Praia do Camaroeiro-Caraguatatuba (Arquivo JRS)


    Há mais de vinte anos eu tive a honra de conhecer o caiçara Marino Garrido, de Caraguatatuba. Passei uma tarde proseando na casa dele, bem no centro da cidade. Agradeço por Priscila, sua neta, me proporcionar a oportunidade ímpar.

    Marino escreveu um livro sobre a Fazenda dos Ingleses. Foi vereador e era muito querido por todos. Uma das histórias dele foi em torno de uns cavalos que comeram uma canoa. Na prosa dele aparece um pescador (Zé Lopes) que tinha um rancho de canoa na praia do centro, quase chegando no Camaroeiro, onde a atração principal é a beleza da paisagem formada nas marés baixas. 

    Era um rancho muito velho, querendo cair a qualquer momento, mas servia de proteção à velha canoa de capurubu. "Era melhor do que ficar no tempo, pegando sol e chuva". Um primo desse, o Bernardo Amaral, morador ali perto, onde é a praça hoje, bem defronte ao mar, tinha um costume que sempre foi comum no pessoal daqui: se encostar em alguma parede ou árvore para coçar as costas. É  natural naqueles que sempre vivem expostos ao sol: a pele se renova  com mais rapidez; por isso a coceira se manifesta tanto. E aqui é que vem o miolo do causo: num entardecer, depois de ajudar a puxar a canoa no rancho, os dois primos ficaram por ali em prosa. E, conforme o hábito, Bernardo se ajeitou no esteio de taquiúva do velho rancho para se coçar, sem considerar a lastimável condição notória para todos. Tudo desabou como era esperado há muito tempo. O coitado pediu desculpas, se ofereceu para construir outro ali mesmo, mas nunca que o rancho foi refeito. A canoa, velha demais, com remendos até se remontando, ficou exposta ao tempo. Naquela época uns cavalos viviam pastando por ali. O Zé Lopes deu azar, pois os animais acharam bom lamber e roer as bordas da canoa que guardavam sal. Só sei dizer que não demorou nada para se acabar desse jeito a embarcação que a tantas e tantas pescarias tinha conduzido o Zé Lopes. Ou seja, virou comida dos cavalos a velha canoa tirada de um majestoso capurubu.

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