sexta-feira, 1 de maio de 2020

CANTORIA DE GROTA

Aqui, meu filho. Olha quem faz cantoria na grota! (Arquivo JRS)


                Tio João, ao me escutar de vez em quando cantalorando em algum lugar (pelos aceiros, sobre pedras, trepado em árvores etc. ), dizia rindo: “Que cantoria de grota é esta?”. Eu nem ligava, continuava por ali tranquilo. Quase sempre ele estava me procurando para ter ajuda em algum serviço.

                Vou explicar o que é cantoria de grota. Creio que poucas pessoas tenham tido a oportunidade de escutá-la. Trata-se um encantamento! Falo assim porque, desde muito pequeno, por morar perto de alguma grota sempre, eu me esquecia de tudo assim que ouvia um canto rápido, ritmado, agradável. Acreditava que era canto de passarinho. Até pensava, naquele tempo, por se esconder bem rasteiro, se tratar de um fura mato ou até parente da corruíra. Eu me empenhava em tentar ver quem era o responsável pela cantoria, feita de pedaços curtos.

Numa certa ocasião, indo até a Pedra da Igreja, assim que eu escutei o tal canto parei. O meu pai, vendo que eu ficara para trás, retornou para ver o que estava acontecendo. “Não é nada não, pai. Só estou querendo ver esse passarinho que está falando logo ali. Escuta só”. Ele deu uma gostosa risada. “Não é passarinho, Zezinho. É sapo! É sapo da grota! Vamos procurar, você vai ver só!”. E ele, tomando a dianteira, se agachou para ver as pedras mais de perto, tentando enxergar a parte escondida delas. De repente, ele foi com a mão bem devagarinho e pegou alguma coisa. Assim que abriu, eu vi aquele minúsculo sapinho. “Aqui, meu filho. É ele que canta nas grotas. Deste tamanho, mas de longe a gente não deixa de escutar a sua fala. Os mais velhos diziam que, quando é assim, ele está chamando namorada. Então é muito namorador, né?, porque está sempre em cantoria! Imagina só se ele fosse sapo grande, do tamanha da entanha!?!”.

Até hoje, quando estou em alguma trilha, não tem como eu não deixar de andar assim que escuto a falação deles. Eles não são poucos! Basta ser em lugar de grotas, com água ao menos merejando, mantendo úmido o lugar. E, em ocasião assim, faço questão de que todos parem para escutar tão singular canto. “Vamos parar para apreciar a cantoria de sapo da grota. Que tal?”. E de vez em quando até conto esta minha história, de como eu conheci esse sapinho.

Coisa nossa! Coisas de caiçara!                

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