Assim era Saco da Ribeira, na década de 1970 |
A imagem acima mostra um canto deixado (por enquanto?) aos caiçaras da praia do Saco da Ribeira.
No inverno de 1975, no jundu deste lugar, eu, num ponto que não existe mais a praia porque as "náuticas" foram construídas, juntamente com Cláudio “da Nádia”, Joãozinho “Barbudo” e mais alguns que por ali “faziam hora para jogar uma bolinha” no lagamar, escutávamos o velho João Miguel. É lógico que o assunto principal era em torno de pescaria, sobretudo de tainhas nos meses de maio e junho, quando abundavam cardumes que tinham vindo do Sul à procura de águas mais quentes para a desova. Era quando os donos das grandes redes “faziam a mala”, lucravam de verdade. Ouçamos o pescador da praia do Saco da Ribeira:
“Este mar sempre foi bom pra pesca. Ainda mais pra cercar tainha! Olhem só: estão vendo ali a Ponta da Lage Grande, pra fora da Santa Rita? Desde lá, até a Ponta do Flamenguinho, a água coalhava em muita ocasião. Era só chegar o mês de abril em diante, que os homens se desesperavam. Ninguém queria pensar em outra coisa que não fosse estar com redes e canoas preparadas para a temporada das tainhas.
Daqui quem tinha as maiores e melhores redes era o João Glorioso. Na praia do Lázaro era o Antonio Peres quem comandava. Ele também tinha e ainda tem as melhores canoas! Passando a praia Brava, se alcança o Perequê-mirim, onde é o Pedro Cabral que possui mais posses, tem as melhores redes e é muito trabalhador. Aquele pessoal também tem muita garra pra pescaria! Logo depois, na Enseada, uma praia muito boa para puxada de rede, sempre teve ‘gente influída, que gosta de se bater no mar’. Agora, quem tem mais recurso lá é o Altino Maciel, que tinha uma venda grande e sortida logo no pé do morro, depois do Giró. Hoje é dono de mercearia e padaria no coração da cidade. Quem ficou no seu lugar na Enseada foi o Eduardinho Graça. Este tá ganhando dinheiro!
Não chegava a três meses de pesca de tainha, mas era uma fartura que deixava todo mundo contente. Os balaios e gamelas ficavam cheios; os comerciantes ganhavam dinheiro mandando peixe seco pra Santos. Era um tece-tece na serra sem parar, pois os caipiras traziam os seus produtos e voltaram com os animais carregados de tainha seca. Coitados dos burros!
Quando o cardume não encostava, só ficava no largo, o jeito era troiar: cercar com rede lá mesmo em muitas canoas para bater na água e fazer o peixe se malhar. É um espetáculo difícil de se dizer. Muitas delas voam! Por isso que tem os aparadores rente ao cabo: esperam catar todas que escapolem. Mas quem disse que conseguem!?”
Na verdade a gente escutava uma história que já tinha escutado outras vezes, contado por outros caiçaras. Só que ninguém se cansava de ouvi-las, pois sempre tinha um detalhe a mais. Afinal, as percepções, os sentimentos e as experiências de cada contador davam um toque especial. João Miguel era espia: quem dava o sinal e o tamanho do cardume; fornecia o principal para ver se compensava largar a rede logo ou esperar mais um pouco. Imagine o olhar desse homem! Que parceiro valoroso para o João Glorioso!
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