Muita gente diz que o meu parente Mané Bento sempre foi um grande inspirador de causos. Eu concordo e acrescento: toda a vida dele foi um causo com mínimos intervalos de outros gêneros. Hoje, em memória do saudoso caiçara, vou contar do breve período em que ele decidiu ser comerciante.
A casa do Mané Bento, em branco e azul como de tantos outros caiçaras, estava no começo da restinga, logo acima da linha dos jambuís, dos abricoeiros e das amendoeiras: no jundu. Neste, no caminho de acesso ao seu terreiro, abriu um ponto comercial. Era a Venda do Mané Bento. Não tinha muita coisa além das garrafas de vinho e de pinga; não era sortida, mas sempre tinha freguês. O Nino Zacarias era um daqueles que não desencostava o umbigo do balcão feito em cimento queimado pelo tio Mesquita. Tinha também alguns trabalhos em cestaria feitas por vizinhos. Nisso - ser comerciante- o meu parente ficou somente o tempo que o fiado permitiu. Não demorou muito para que o “prédio” virasse ruína.
Em uma ocasião, precisando de sabão, a minha vó Eugênia pediu ao filho (Tônico) que fosse até a venda do seu primo Mané Bento e trouxesse uma barra (ou pedra de sabão). Não demorou muito para que a encomenda chegasse. Porém, assim que desembrulhou, ela notou que estava cortada ao meio, ou seja, o comerciante só lhe vendeu metade de uma barra. Na mesma hora ela se dirigiu até o primo para tirar satisfação; queria saber do motivo de ter lhe mandado dessa forma a encomenda. A resposta dele, cheia de convicção, foi a seguinte:
“Minha prima, é verdade: eu vendi meia barra de sabão. Mas não foi maldade, nem esperteza. Se eu lhe vender uma barra inteira, logo vai acabar o meu estoque. Isso não pode acontecer! A minha venda tem que ser sortida de tudo!”.
Depois dessa justificativa, a minha vó tomou a decisão de voltar a fazer o sabão de cinza.
Sugestão de livro: Ilhabela – Seus enigmas, de Jeannis M. Platon
Boa leitura!
José Ronaldo dos Santos
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