Homenagem aos pescadores Maneco Hilário, Alfredo Vieira, Dito Corovina, Zé Capão e tantos outros (Foto: José Maria Fonseca)
Agora,
chegando o tempo da tainha, se valendo da fotografia antiga mostrando o Maneco
Hilário e outros, fiz um exercício de memória a partir da postura, dos gestos
deles. São, pelo menos, dez companheiros que estiveram pescando, puxando a rede
na praia, entre o Itaguá e o Cruzeiro (Yperoig). É dia ensolarado. Nenhum dos
antigos pescadores usava calção ou bermuda. Seria desrespeitoso tal indumentária.
Lógico que não poderia faltar o chapéu! Por isso, acho que posso reapresentar o
texto do Chapéu nosso de cada dia.
Houve um tempo em que o chapéu, esse produto
cultural tão antigo, era
indispensável para se sair de casa.
De dia ele nos protegia das chuvas finas e
dos raios
solares, “para não esquentar os miolos”; nas noites a
proteção era
contra o sereno, a friagem natural que podia
deixar resfriado, “capaz de ficar
constipado”.
A produção de chapéu era artesanal, com as mulheres se esmerando entre palhas
de junco, de brejauba, de bananeira e outras matérias-primas do nosso entorno.
Não era incomum avistar, geralmente nas salas das casas, as “bolas de tranças”.
As tranças eram feitas a partir de material devidamente preparado, ocupando os
momentos de descontração, enquanto proseavam. Depois era só costurar as bordas,
no sentido de dentro para fora, usando fios resistentes, de preferência os de
tucum que davam um perfeito acabamento.
De acordo com a tia Maria Mesquita, fazer tranças para vender nos barcos de
cabotagem era uma alternativa econômica: “Rendia um dinheirinho que
permitia a gente comprar cortes de fazenda para as roupinhas das crianças, para
fazer vestidos”.
Homens e mulheres saíam pelos matos coletando, principalmente as palmas novas
de brejauba. Se precavendo contra as cobras peçonhentas, os caiçaras esfregavam
alho nos braços e nas pernas. Depois murchavam a palhada no terreiro, de
preferência sobre pedras, e, mão à obra. Um recurso para manter o chapéu no tom
amarelo vivo era abafá-lo no enxofre queimado. Quanto charme num desses
chapéus!
Interessante era ver as pessoas tirarem suas coberturas ao se cumprimentarem,
ao pedirem ou darem suas bênçãos ou simplesmente para mostrarem suas cabeleiras
bem arrumadas e devidamente mantidas pelos chapéus. Nas igrejas ninguém entrava
de chapéu na cabeça.
O filósofo Jean-Paul Sartre escreveu este detalhe a respeito de outra utilidade
do chapéu: “Você botava as madeixas dentro da copa e já nem se sabia se ainda
tinha cabelos”.
Na cidade vizinha de São Luiz do Paraitinga existe o Rio do Chapéu. De acordo
com os relatos de cronistas de outros tempos, ali funcionava a famosa Fábrica
de Chapéus, de onde descia regularmente uma tropa de burros com seus produtos a
serem escoados pelo porto de Ubatuba. Essa tropa chamava a atenção pelo tom
claro que se destacava de longe entre o verdor da mata, na nossa Mata Atlântica.
Era a “Tropa branca”.
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