Acréscimos: mentira ou criação?
Com relação aos acréscimos feitos aos causos (invenções a partir de um acontecimento) no ato da narração oral ou, principalmente, na escrita dos causos – que se tornam contos, no entender de alguns contadores –, os entrevistados explicam:
JS: Você diz “o escritor é mentiroso”. É, porque ele cria. Ele é mentiroso porque ele cria, mas tem uma parte, uns sessenta por cento, uns setenta por cento que é verídico, que aconteceu. São fatos, né? Então ele acrescenta, ele enriquece aquela cultura. [...]
Tem o causo e tem a imaginação que é o seguimento do conto. Então quem escreve mistura uma coisa com a outra pra dar uma pitadinha de sal, um gostinho no ponto. Pois se você vai fazer uma história sem ter uma pitadinha, não fica legal, né? [...] Então tem que ter uma brincadeira, e eu faço meus contos, no fim eu faço uma brincadeira, você tem que relaxar um pouco, né? Muitas vezes é coisa verídica...
Nesse segmento, o contador admite os acréscimos para as narrativas escritas, que ele diferencia do causo ao dizer: “tem o causo e tem a imaginação que é o seguimento do conto”. No trecho em que o contador afirma: “você diz ‘o escritor é mentiroso.’ [...] ”, não está se referindo ao diálogo imediato com a pesquisadora que o entrevista, mas está respondendo dialogicamente, no sentido empregado por Bakhtin (1997), aos já-ditos que circulam na sociedade. A sua resposta é uma defesa em favor da criação: “é, porque ele cria”, mas arremata logo dizendo que a maior parte é verdade. Sua resposta parece se unir a de um de nossos maiores escritores, Ariano Suassuna (2000):
No caso do mentiroso, eu acho que é natural: todo escritor é um pouco mentiroso, um pouco Chicó – o mentiroso que mente não para prejudicar alguém, mas por amor à arte de mentir.
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