sexta-feira, 2 de março de 2012

“ A que artura nóis tamo?”



                           Isto era meados do século XX:
                Chiquinho Fidélis e Luís Lima, amigos e compadres, caiçaras da Marafunda, se aprontaram já no serão para a festa de São Pedro, na “praça da igreja”, no centro da cidade. Naquele tempo, o pároco era o frade franciscano Tarcísio, um italiano que se atrapalhava na língua, mas se saía muito bem como festeiro. Ele também é famoso pelas grande procissões que aconteciam da capela do Itaguá até a igreja Exaltação da Santa Cruz.
                Para quem não era de muita reza, o aconselhável era chegar mais tarde, quando tinha findado a novena (toda recitada em latim). Por isso os dois compadres ainda acharam tempo para bebericar uma “ubatubana” na Venda do Marcolino, que era  logo ali, na saída do bairro.
                Conversa vai, conversa vem, entre uma dose e outra e mais outras, os dois pediram um queijo. Ali, no mesmo instante, o saboroso produto trazido da Vargem Grande semanalmente pelo Pedro Santana, foi consumido até mais da metade. Só sei dizer que demorou ainda um bom tempo para os dois se desencostarem do balcão muito bem feito em cimento queimado e vermelhão. Depois, em direção da cidade, os dois saíram trocando as pernas e derrapando em cascalhos.

                Já em um terço do caminho, no lugar denominado antigamente de Furado (onde hoje é o ponto comercial do Tião Guedes), a via estava em péssimo estado, com buracos guardando água da chuva de dois dias. Em alguns deles era capaz de caber gente agachada. No céu a lua cheia brilhava igual casca de ostra aberta no cisqueiro do tio Durval.  Com muito custo os dois iam escapando de tombos mais feios. De repente o Chiquinho Fidélis estacou olhando para um dos buracos.
                - Olha lá, compadre Luís! Não é o nosso queijo?
                - Que queijo, compadre!? Aquilo é a lua!
                - Nada disso! Aquilo é o nosso queijo!
                - Que é isso, compadre!? Parece que bebeu demais! Quem não vê que aquilo é a lua!?
                Nesse momento, apareceu a fala do Chiquinho Fidélis que entrou para a História:
                - Pra dá um ponto finá nesta conversa, compadre, preste atenção: se aquilo lá embaixo é a lua, a que artura nóis tamo?

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