quarta-feira, 19 de agosto de 2020

PRÊMIO PELA LUCRATIVIDADE

Paraty artesanato (Arquivo JRS)



                “Abram seus comércios, não se importem com os mortos. O que vale é não deixar a economia parar”. Era frase dos ricos, dos comerciantes, no começo da pandemia. Agora até pobre está repetindo isto. O miserável que fundeia saco de ostras na costeira para o dia seguinte também anda a dizer coisas do gênero.

                É tempo de pandemia, mas pouco importa a vida dos trabalhadores. “Temos um enorme exército de reserva de trabalhadores!”. Os mais endinheirados já sabem que estão fora de perigo, têm vagas intocáveis em bons hospitais, podem se resguardar da massa. E desejam continuar assim, longe do povo! As notícias desses estabelecimentos é que há leitos à vontade. Por isso dizem que “até as escolas podem voltar à normalidade”.

                Há gestores, desconfio eu, que defendem os interesses mesquinhos da elite e de governantes que assinam sem nenhum pudor essa política de morte, porque almejam migalhas a mais em seus proventos. Será que serão recompensados por isso (de apoiarem a necropolítica, de pressionarem colegas que estão no mesmo mar, em embarcações soltando tábuas ainda em água rasa, enquanto os navios da classe dominante nem sentem as grandes ondas, os vagalhões oceânicos)? A verdade é uma: estamos longe de garantias para enfrentar o vírus do momento. Foram as omissões do governante-mor que resultaram nesse número absurdo de mortes. Alguém duvida? Ciência negada em prol do lucro de alguns grupos, de uma minoria privilegiada. Pouco importa as vidas dessa gente, desses pobres. “Danem-se essas famílias esfrangalhadas”, afirmam. “Nós precisamos ganhar dinheiro e curtir a vida!”.

                Tudo o que estamos passando agora, faz-me lembrar de séculos atrás, quando o tráfico de escravos garantia os lucros de uma elite, lançava as bases das nações modernas e do nosso país:

                “A Companhia das Índias, que tinha o monopólio do tráfico na França no começo do século XVIII, oferecia um bônus aos capitães de navios que conseguissem reduzir as taxas de mortalidade. O prêmio era oferecido em escala: seis libras por escravo caso o índice de mortos fosse inferior a 5% sobre o total de embarcados; três se ficasse abaixo de 10%; duas se chegasse até 15%; e uma libra para perdas de no máximo 20%. Isso significa que, mesmo nas viagens em que morresse um quinto da carga, ainda assim o negócio seria lucrativo a ponto de o capitão receber um prêmio pelo sucesso da travessia”. É o que nos conta o historiador Laurentino Gomes.

                Termino com frase atribuído a Che Guevara: “Triste não é amar sem ser amado. Triste é defender o capitalismo sendo do proletariado”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário