Eu e Nízio: frio de cobrir os braços (Arquivo JRS) |
“Não é esta a rua. É a outra que não tem uma coisa grande amarela como
aquela ali. Nesta rua, tá vendo ali?,
tem a casa da passarinhada ao lado de onde é o médico de vistas. O dono da casa
põe água com açúcar, banana, mamão e
quirera; todo tipo de passarinho passa o dia inteiro num vai e vem. Vamos
atravessar depressa para ver de perto”. “Nossa! As mariquitas parecem despencar no
bebedouro e subir feito ondas! Olha no prato do lado, cheio de rolinhas, canários e outros que nem
sei os nomes!”. “E ali,então! Sanhaços, tiés, bonitos e outros estão na
festança!”. Eu tenho de concordar: é um banquete na beira da rua. As duas
mulheres estão perfeitas na empolgação. Eu estou lendo perto delas, no portão
ao lado, num banquinho improvisado. Seus olhos brilhavam, suas cabeças se
moviam pra lá e pra cá, pra cima e pra baixo. Passaram tempo ali encantadas
pelos passarinhos coloridos, na farra pela bebida e comida que gente bondosa
oferece. Na verdade, parei no número 16 esperando Nísio, o purubano. Ele é o
pedreiro da obra. "Serão salas para alugar", segundo ele. “O meu genro é o proprietário, está fazendo aos poucos, conforme o dinheiro deixa”.
Nízio é do sertão do Puruba, mas
vive na Estufa II há mais de quatro décadas. Conheço suas filhas desde que
nasceram. É dançador de congada da mesma turma dos saudosos Dito Fernandes,
Pedro Brandão, Anastácio, Decão e outros tantos empolgados da Congada de São
Benedito do Sertão do Puruba, que desceu a serra por influência de Cunha, o município vizinho.
De repente uma das mulheres diz: “Ai, vamos embora, Juraci. Temos que
ir para outro lugar. Logo escurece, mas
lá só tem claridade”. Dei uma piscada e não vi mais as duas, mas reconheci pelas costas o Élcio Salomão. Logo
desapareceu também. Será que sonhei embalado pelos pios dos passarinhos? Me dei conta
que as duas de antes eram Cida e Juraci, primas que nos deixaram.
Agora, acabou passando o Élcio, outro caiçara do tempo do papai, de um falar
contagiante, especulador de fatos e contador de histórias, sobretudo do nosso
lugar, pois nasceu na prainha, logo depois da boca-da-barra da Maranduba, bem
dizer aos pés do Morro do Cemitério. Na minha infância, ele era mascate, andava
negociando por todos os lugares daqui. Andava muito e conhecia muita gente. Sempre
foi muito bem acolhido lá em casa. Não sabia o que fazer a mais para nos
acolher bem na sua moradia, ali, na rua detrás do “Tubão”. Terminou o seu tempo como corretor de imóveis. Devo muito ao Èlcio pelas boas prosas. A certeza é que todos vamos passando. Somente as memórias poderão permanecer.
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