terça-feira, 21 de novembro de 2017

CANSADO DA VIDA

Por que fugir de tantas belezas? (Arquivo JRS)

               Conforme eu já escrevi, muitos dos caiçaras, sobretudo os que nasceram sob influência do turismo, traíram seu espírito original, foram corrompidos pelo lema: “vida fácil  é que vale a pena”. Assim foi com o “Menino”. "Não entre nas drogas. Não fuja das belezas que estão ao nosso redor. Faça bom uso da sua vida" , aconselhava o meu padrinho Tobias aos filhos de tantos que por ali zanzavam meio que perdidos. 

               “Menino”, filho do Chico Caçapa, logo cedo se tronou um viciado em um monte de porcarias. De vez em quando realizava algum trabalho que lhe rendia alguns trocados. De tanto infernizar o pai, conseguiu a sua motocicleta, dessas “cabritas” que vivem se esquivando das batidas policiais. Numa dessas fugas, o “Menino” bateu no poste na beira da estrada e morreu. Era 22:30 horas, de uma noite tranquila de primavera. O céu estava estrelado, mas algumas nuvens se mostravam como tempo virando para o final de semana. Ainda bem que, no meio do caminho, o imprudente motociclista deixou a garota que o acompanhava. É ela quem nos conta o contexto do trágico fato:


               “Eu e ‘Menino’ tínhamos um caso há meses. Era o meu namorado. Naquela noite nós vínhamos do bairro vizinho, onde havia um produto novo com uns caras, gente nossa. Na pista, hesitamos em entrar pelo outro caminho de casa, retornamos à pista. Atrás de nós vinha um carro, na mesma velocidade que nós. Uma buzinada nos alertou, evitando assim um acidente logo ali, onde, provavelmente eu também teria chegado ao fim. O carro passou por nós. ‘Menino’ acelerou bravo por ter sido ultrapassado e porque estava com a cabeça cheia. Logo depois da ponte, ao ultrapassar o dito carro, ele chutou o retrovisor,  xingando muito o motorista. Eu ralhava, mas ele continuava na loucura. Não vimos o condutor porque o vidro era escurecido. Para despistar, logo entramos na primeira saída asfaltada. A intenção era retornar ao Largo para mais um rolê, tomar uma cervejinha e escutar um sonzinho antes de ir para casa dormir. Estávamos voltando quando avistamos o tal carro entre os policiais. Ali eu desci enquanto o meu parceiro fugia a toda velocidade. Vi em seguida as viaturas saindo, na mesma direção, no rumo que o ‘Menino’ tomou. Fiquei nervosa. Trinta minutos depois, estando em casa, sem conseguir notícia alguma com os mais chegados, recebi a mensagem de uma amiga: ‘Menino morreu. Bateu num poste. Estava correndo demais. Sinto muito’. Eu também senti muito; ele não era uma pessoa ruim. Só que estava cansado da vida”.
     

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