Mulheres remadoras no rio Puruba. |
O
ubatubense Gilberto Chieus Júnior, ex-colega do tempo de escola no “Deolindo”,
mestre em Educação Matemática pela Faculdade de Educação da Unicamp,
descendente dos donos da Fazenda Velha (produtora da pinga Ubatubana), em 2005
publicou, na Enciclopédia Caiçara (Volume IV), uma entrevista com os irmãos
Néri e Manoel, mestres na construção de canoas no Sertão do Ubatumirim.
Os
irmão se alternam para explicar a arte desde a escolha da madeira, passando
pelas medidas e outros detalhes. Essa pesquisa, que encerra os conhecimentos,
cálculos e técnicas herdados dos mais antigos, desde a localização da árvore na
mata até a conclusão da peça, é classificada como Etnomatemática. Vejamos
então:
Desde pequeninho
eu comecei a trabalhar pra ajudar meu pai. Fazer canoa, com machado, aprendi
com meu pai. Eu ia olhando o que meu pai fazia, via onde batia as linhas, os
níveis, o prumo. Não tem como ensinar pra passar pro outro. Você vai olhando e
vai aprendendo. Tudo no olhar. Meu pai, acho que foi com um livro que tinha
antigamente. Ele viu. E com o meu tio. Meu tio fazia canoas e veio ajudar ele
fazer. Depois passou pra nós. E até esses tempos que meu pai tirava eu nem era
nascido. Meu pai já criava nós nisso aí. Meu pai criou oito filhos fazendo
canoas. Aí ele separava a madeira. A madeira que aguenta fazer cabo, vai virar
canoa, madeira pra ficar pro machado, madeira pra fazer gamela, tudo isso ele
fazia. Aí a gente ia olhando, pra ver que madeira que era, que madeira que era
boa pra fazer remo, tudo isso, não é qualquer madeira que serve. Tem que ser
uma boa.
[...] Ele olhava a
olho, e copiava lá. Ele já tinha imaginação, cara. Quem sabe já tem na
imaginação, já olha numa árvore e vê onde que é a canoa. Eu tenho isso. O meu
pai tem isso, meu irmão Baéco. Eu já tenho a parte certinha da canoa, na tora.
[...] Aqui você
não enxerga nada... então você sobe em cima de morro e enxerga outro. Que
madeira que é. O tipo que é, quando cai a folha, você conhece tudo. Então você
pega aquele espigão ali, sobe o espigão que você que você acha ela lá, que
madeira que é. Não vai lá pensando que é uma madeira que não presta. Vai
procurar uma madeira que esteja com ferro, e esses negócios. Às vezes você está
procurado um, acha o outro, a gente vai procurar uma árvore de um metro, você
não acha essa de um metro, mas acha uns de sessenta, setenta, oitenta, aí você
vem com aquilo na cabeça. Eu já sei onde tem a madeira está em tal lugar... é
tudo assim... nunca perdemos o tempo em sair pelo mato e procurar pau da canoa.
Já sabe mais ou menos onde é.
[...] A canoa ele
mede, é contrário de outras coisas, a gente mede no meio, e do meio pra fora.
Canoa norma sete bocas [largura], canoa sobrecurta seis bocas e meia e meia
canoa mais comprida sete bocas e meia. Uma canoa tem 0,80 cm de boca. Se tem
sete bocas, ela vai medir 7 x 0,80 = 5,60 m.
[...] Naquela
época utilizava a palma da mão e a encomenda era feita da seguinte forma: quero
uma canoa com quatro palmos ou três palmos e meio de boca. Como varia muito de
cada pessoa, mudamos.
Como vimos, é importante
o registro de todos os aspectos da nossa cultura. Legal é também saber que
esses conhecimentos embasam estudos em outros níveis teóricos.
Desse
pessoal, por todas as praias de Ubatuba, estão espalhadas as canoas saídas do
Sertão do Ubatumirim. São as lindas
canoas caiçaras!
Meu avô,João Zacarias de Oliveira (In Memorian) pescador da praia da Maranduba,comprou muitas canoas no Sertão do Ubatumirim!!Como é importante resgatar nossas raízes!
ResponderExcluirOlá Zé Ronaldo estou muito feliz pela publicação e tenhos outras o dia que eu estiver em Ubatuba lhe procuro.
ResponderExcluirE a nosso amigo Diógilei Tadra que tenho otimas lembranças do seu querido avó. Diógilei sou casado com a neta do João Firmino primo e um grande amigo do seu avó. Minha esposa é a Fatima do João Oliveira.
Um grande abraço
Gilberto