João Alegre e Renato Teixeira - Arquivo Tempos d'antes |
VIOLA, MINHA VIOLA
A
minha lembrança de antigamente, quando menino ainda, era de se admirar ao ver grande parte das
casas caiçaras de pau-a-pique com o piso da sala assoalhada, tendo o restante dos
cômodos no chão duro. Fui entender a razão apenas quando era dia de festa, de
dança. O tablado respondia ao bater dos
pés nas funções (bailes). Assim, bate-pé era sinônimo de dança entre o meu povo.
(Fico imaginando o desespero do lagarto que morava debaixo das tábuas da sala
do Nhonhô Armiro, na praia da Fortaleza, nas noites de bate-pé). Hoje, recorrendo às anotações do
Olympio Corrêa de Mendonça, transmito a contribuição de Mané Mancedo, do
Ubatumirim, acerca da dança chamada marrafa, uma cantiga executada na dança da
ciranda nas funções. Num de seus passos, formam-se duas rodas: a externa, dos homens,
e a interna, das mulheres que dançam em sentido contrário ao dos cavalheiros. A
marcação fica ao encargo dos violeiros, sendo o momento mais redundante aquele
em que as damas, balanceando em torno dos respectivos pares, em evoluções
sucessivas, alternam-nos. A cantiga, rasqueada pelas violas, é empolgante como
as demais cantorias locais. Acompanhe o Mané Mancedo. Saudações à caiçarada
que toca em frente nossas cantorias e danças. Grande estima eu tenho por vocês.
Viola, minha viola
Viola, meu violão;
Quebra na marrafa
Viola, meu violão;
Minha viola conhece
O punho da minha mão.
Me chamo Manoé
Me conhecem por Maneco;
Quebra na marrafa
Eu canto de peito aberto;
Quem apanhô foi o galim
Quem morreu foi o marreco.
Fiz a casa no arto
Do arto se enxerga tudo;
Quebra a marrafa
Do arto se enxerga tudo;
Esperando meu benzinho
Quando vorta do estudo.
Marrafa é boa dança
Veio de Montevidéu;
Quebra na marrafa
Veio de Montevidéu;
Ainda onte uma ave pousô
Na aba do meu chapéu.
No cabo dessa viola
Eu faço guerra civi;
Quebra na marrafa
Eu faço guerra civi;
Em cima da carabina
Eu faço cama pra dormi.
Peito que canta firme
É peito curitibano;
Quebra na marrafa
É peito curitibano;
Eu canto dia, canto a noite
Pois canto à roda do ano.
Viola, minha viola
Vamo no campo chorá;
Quebra na marrafa
Vamo no campo chorá;
Você sabe nome bão
Pra onde eu vá mariscá.
A tainha é um bom peixe
Que corre na costa do má;
Quebra na marrafa
Que corre na costa do má;
Quando chega no baixio
Logo se põe a sartá.
No embalo dessa moda
Que minha boca falô;
Quebra na marrafa
Que a minha boca falô;
No peito sarta saudade
No coração o amô.
No dia que eu morrê
Me interre no chapadão;
Quebra na marrafa
Me interre no chapadão;
Dexando uma mão pra fora
Com seu retrato na mão.
O sinhô que me descurpa
O momento já que está;
Quebra na marrafa
O momento já que está;
Eu vô dá uma corridinha
E a viola já vô pará.
Um pau com trinta galho
Cada galho tem seu ninho;
Quebra na marrafa
Cada galho tem seu ninho;
Cada ninho trinta ovo
Quanto são de passarinho?
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