sábado, 8 de julho de 2023

QUANTO SÃO DE PASSARINHO?

 

João Alegre e Renato Teixeira - Arquivo Tempos d'antes

VIOLA, MINHA VIOLA

      A minha lembrança de antigamente, quando menino ainda, era de se admirar ao ver grande parte das casas caiçaras de pau-a-pique com o piso da sala assoalhada, tendo o restante dos cômodos no chão duro. Fui entender a razão apenas quando era dia de festa, de dança.  O tablado respondia ao bater dos pés nas funções (bailes). Assim, bate-pé era sinônimo de dança entre o meu povo. (Fico imaginando o desespero do lagarto que morava debaixo das tábuas da sala do Nhonhô Armiro, na praia da Fortaleza, nas noites de bate-pé). Hoje, recorrendo às anotações do Olympio Corrêa de Mendonça, transmito a contribuição de Mané Mancedo, do Ubatumirim, acerca da dança chamada marrafa, uma cantiga executada na dança da ciranda nas funções. Num de seus passos, formam-se duas rodas: a externa, dos homens, e a interna, das mulheres que dançam em sentido contrário ao dos cavalheiros. A marcação fica ao encargo dos violeiros, sendo o momento mais redundante aquele em que as damas, balanceando em torno dos respectivos pares, em evoluções sucessivas, alternam-nos. A cantiga, rasqueada pelas violas, é empolgante como as demais cantorias locais. Acompanhe o Mané Mancedo. Saudações à caiçarada que toca em frente nossas cantorias e danças. Grande estima eu tenho por vocês.

 

Viola, minha viola

Viola, meu violão;

Quebra na marrafa

Viola, meu violão;

Minha viola conhece

O punho da minha mão.

 

Me chamo Manoé

Me conhecem por Maneco;

Quebra na marrafa

Eu canto de peito aberto;

Quem apanhô foi o galim

Quem morreu foi o marreco.

 

Fiz a casa no arto

Do arto se enxerga tudo;

Quebra a marrafa

Do arto se enxerga tudo;

Esperando meu benzinho

Quando vorta do estudo.

 

Marrafa é boa dança

Veio de Montevidéu;

Quebra na marrafa

Veio de Montevidéu;

Ainda onte uma ave pousô

Na aba do meu chapéu.

 

No cabo dessa viola

Eu faço guerra civi;

Quebra na marrafa

Eu faço guerra civi;

Em cima da carabina

Eu faço cama pra dormi.

 

Peito que canta firme

É peito curitibano;

Quebra na marrafa

É peito curitibano;

Eu canto dia, canto a noite

Pois canto à roda do ano.

 

Viola, minha viola

Vamo no campo chorá;

Quebra na marrafa

Vamo no campo chorá;

Você sabe nome bão

Pra onde eu vá mariscá.

 

A tainha é um bom peixe

Que corre na costa do má;

Quebra na marrafa

Que corre na costa do má;

Quando chega no baixio

Logo se põe a sartá.

 

No embalo dessa moda

Que minha boca falô;

Quebra na marrafa

Que a minha boca falô;

No peito sarta saudade

No coração o amô.

 

No dia que eu morrê

Me interre no chapadão;

Quebra na marrafa

Me interre no chapadão;

Dexando uma mão pra fora

Com seu retrato na mão.

 

O sinhô que me descurpa

O momento já que está;

Quebra na marrafa

O momento já que está;

Eu vô dá uma corridinha

E a viola já vô pará.

 

Um pau com trinta galho

Cada galho tem seu ninho;

Quebra na marrafa

Cada galho tem seu ninho;

Cada ninho trinta ovo

Quanto são de passarinho?

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário