Os nossos hábitos, os nossos mais variados costumes têm suas origens,
suas histórias quase sempre difícil de serem alcançadas. Pensei nisso agora
porque, em 1989, morando um período na Vila Joaniza, na capital paulista, quase
divisa com a cidade de Diadema, conheci uma família maravilhosa: Manuel, Ivani
e filhos. Trabalhadores que vieram da Bahia “tentar a vida aqui em São Paulo”.
Eu me senti adotado como mais um filho do casal, por isso sempre arrumava uma
oportunidade para visitá-los, ver as plantas do quintal, tomar café, prosear etc.
Na primeira oportunidade na qual almocei com essa família, notei
que Ivani comia sem fazer uso de talheres. Usando uma das mãos, ela fazia bolinhos
do que tinha no prato agregando farinha de mandioca. Em seguida, lançava-os na
maior tranquilidade à boca para a mastigação. Aquilo me fez relembrar dos
colegas marinheiros do início da década de 1980, originários da Bahia: eles, em sua maioria, nas refeições, dispensavam
os talheres e se serviam tal como a minha querida família baiana que conheci bem
depois na região sul da capital paulista. Então, foi entre colegas marinheiros, que presenciei pela
primeira vez esse hábito. Hoje, ao ler o relato de um viajante francês, Jean
Barbot, na região próxima do rio Zâmbia (África), no século XVII, se referindo
às viúvas dos portugueses de posses, notei como ele ficou impressionado com uma delas,
dona Catarina, que o recebeu para um jantar em Rio Fresco, em 1681. Estranhou
que todos os presentes comessem com as mãos, fazendo bolinhos com o alimento
antes de levá-los à boca. Era uma clara demonstração que a família estava bem
adaptada aos hábitos locais. Por sinal, muitos desses costumes não eram
exclusivos da África, segundo o pesquisador Laurentino Gomes, já que nessa
época, por exemplo, também comia-se com as mãos em Portugal e no Brasil. Mais para
frente, a Inglaterra, uma potência mundial, encheu o mundo com colheres, garfos
e facas. Quando criança, eu ficava atento, sempre em busca de algum garfo
descartado, para ser fixado em um cabo de madeira e servir de fisga nas
pescarias pelos rios e córregos. Naquele tempo as águas eram limpas, repleta de
cafulas, tamanqueiras e pitus (espécies de camarões de água doce) e de peixes. A
mesma fisga também servia para caçar rãs nos brejos, mas poucos faziam isso,
porque não fazia parte dos nossos hábitos alimentares apreciar tal iguaria.
A minha saudosa mãe, recorrendo
ao que tínhamos garantido graças à roça e ao mar, de vez em quando desfiava uns
peixes secos para fazer, usando a nossa farinha de mandioca, os deliciosos
bolinhos de peixe. Assim que sentíamos o cheiro, à cozinha acorríamos, tal como
gatos esfomeados. Imagina a nossa pressa, tamanha era a gula, em lançá-los logo
à boca!
Nenhum comentário:
Postar um comentário