sábado, 11 de julho de 2020

A ESCOLA DO MANÉ RAMIRO

Na prateleira, como recordação (Arquivo JRS)

                O finado tio Chico Félix sempre foi muito estimado em nossa família. É porque ele tinha carinho por nós e costumava passar em nossa casa, mesmo que fosse às pressas, para deixar algum agrado e tomar um cafezinho. O mar era o seu ambiente natural. Nenhum tempo ruim era capaz de segurá-lo quando cismava de romper a arrebentação das ondas, principalmente se estivesse embalado pela “pinguinha nossa de cada dia”, conforme era costume dizer. Aí que ficava mais destemido!

                Era parte do ritual dele, ao passar em casa, deixar ao menos um peixe. “É para a mistura, cunhada”, se dirigindo à mamãe. Não demorava muito porque sempre foi homem de pouca conversa. Vovó Martinha se preocupava muito com ele para evitar que fizesse coisas erradas. Isto porque, quando bebia demais e minguava o dinheiro, tio Chico cismava de fazer uma catação de plantas pelos quintais para vender aos turistas e beber mais ainda. Coitado do titio!

                Durante um longo tempo, tio Chico arrumou parceria com o Mané Ramiro, outro que vivia trançando as pernas, cercando galinha pelos caminhos. Nesse tempo, as preocupações da vovó aumentaram: “Agora são dois que tenho de cuidar”. Imagina só: dois adultos, pais de filhos casados, dando trabalho para uma pessoa idosa. Podia isso?

                Tio Chico e Mané Ramiro regulavam a mesma idade e tinham igual tempo tanto na carreira de pescar como na vida de bebedeira exagerada. Na minha opinião, nenhum dos dois tinha mais mérito que o outro. “Medalha de ouro para os dois!”. Porém, certa vez a vovó desabafou comigo: “Sabeis porque o vosso tio bebe tanto? É porque anda na companhia do Mané Ramiro! É na escola dele que ele aprendeu levar essa vida porca. Não precisa muito empenho para sair da escola do Mané Ramiro licenciado no vício da mardita pinga”. O que eu poderia fazer após escutar a fala dela? Só pensei: “Capaz mesmo! Até parece que é verdade!

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