Sempre onde estava o movimento (Arquivo Desconhecido) |
Nós, pelos caminhos (Arquivo JRS) |
Tem alguns dias que o Oliveira faleceu. Viveu bem seus 95 anos, com muita
lucidez e uma mente sempre aberta a qualquer assunto. Conversava com todos,
sempre muito animado. Caminhava todo dia da praia Brava até a vizinha Fortaleza,
o seu lugar mesmo! Dizia: “Eu moro na
praia Brava, mas gosto mesmo é da Fortaleza porque todo mundo conversa com
você, tem tempo para prosear e de dar risada. Isso é que é viver!”. Quem
resistia a ficar conversando com esse cidadão, nosso patrimônio caiçara?!?
Conheci o Oliveira, primo do vovô Armiro por parte da Filomena, alguns anos depois que nasci,
quando fomos morar na praia da Fortaleza. Era casado com essa saudosa caiçara, irmã do
Mané Bento. Maria das Dores era a filha única do casal. Moravam no jundu, quase
no meio da praia, entre bonitas árvores (abricoeiros, abacateiros,
laranjeiras...). Era costume desse valoroso caiçara pescar sozinho; quando
menos se esperava lá se ia ele remando tranquilamente em direção à Ponta, ao
Mar Virado, ao Lázaro, onde vendia coco
verde na temporada... Dele eu já escrevi a famosa Luz do Oliveira:
uma das coisas de outros tempos que hoje poucos acreditam. Assim que enviuvou,
cheio de saúde, o Oliveira logo se casou de novo, mas dessa outra geração
(filhos e netos) eu sei pouca coisa. Na verdade, o nosso personagem de hoje fez
parte da minha história desde a primeira infância, quando não havia muros e as
pessoas se importavam mais com as outras, valorizavam mais a vida comunitária.
Havia pitirão para quase tudo naquele tempo!
Como já expressou um pensador africano, “quando morre um idoso, é como se uma biblioteca tivesse sido queimada”.
E é mesmo! Escutando o Oliveira, aprendi sobre a Ponta Aguda, seu lugar de
origem. Também ele era da família dos Quintinos, cujos antepassados possuíam a
ilha do Tamanduá. Depois, as idas e vindas fez de sua mãe uma verdadeira
heroína, capaz de dar um exemplo de vida maravilhoso. Nas suas palavras: “Mamãe lutou muito, teve uma existência
sofrida, mas me ensinou a ser digno, a respeitar e ser respeitado. Ela fez
muito bem a parte dela. Devo muito a ela por ser o que sou até este dia”. Ah! A força das mulheres! Gostoso
mesmo era escutar o Oliveira dizer: “Eu vi a sua mãe criança, seus tios todos.
O vosso avô era um companheiro valoroso, de palavra. Nunca tivemos uma
desavença”.
Certa vez eu perguntei ao
Oliveira se a tal luz que o perseguia não
seria a Mãe de Ouro. E ele: “Não sei,
meu filho. Mas se fosse, queria dizer que naquele lugar, onde estava a minha
pobre casa, tinha ouro? É, pode ser que era mesmo! Afinal, naquele jundu eu
vivi momentos de muita felicidade, via a Lua e o Sol despontar sobre o mar, o
nosso mar. Puxava rede ali mesmo. A poucos metros do lagamar ficava o meu
rancho de canoa, as minhas tralhas de pescarias, o meu terreiro, a minha casa...
Bastava uma rolada só e já me preparava para sair remando naquela calmaria tão
comum. Ali se criou a minha primeira filha e ali ela começou a namorar o Jeová,
filho do compadre Siledônio que morava logo depois, quase chegando no Canto do Joaquim. Ali fizemos tantas
festanças... Quer ouro melhor que isso tudo? Quer riqueza maior? Então, aquela
era a Mãe do Ouro sim! Ah, bendita luz!”.
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