Em 1990, os herdeiros do saudoso José Kleber lançaram Praia do Sono, uma seleção das poesias desse cidadão paratiano, escritos entre 1953 e 1956, num tempo em que a cidade vizinha ainda vivia isolada, sem o glamour dos dias atuais.
É impossível, ao passear entre seus casarões coloniais, não recordar do caiçara fluminense que admitiu: "em cada pedra redonda da tua rua deixei uma lágrima escondida que fará brotar mais ervas".
Pescador, pescador
que não se perdeu
na superfície cruzada
e desembarcou
vitorioso de nada
no arquipélago cotidiano!
A rede de sonhos,
coroa de menino
agora já é tecida
por cabelos brancos.
E a fartura, que não é
milagre de multiplicação,
nas cestas de ferrugem e escama,
onde mil olhos desfilam
gananciosos.
Meu coração pescador,
jaz no fundo,
com um nome acorrentado.
O teu, navega no peito,
tatuado em azul-marinho.
Meu cabelo é noite pura,
enquanto queima-se toda
tua fronte amadurecida
ao sol que vem de bombordo.
Teu anzol e meu braço
ceifando profundidades
e ondas de viração.
No xiba perderam-se
tamanco e juízo.
A viola não fica tonta
como a gente,
e as vozes povoam cordilheiras
maciças de novas terras.
Pescador!
No lombo onde assentaste
o mastro do teu partir,
devassado e sem fim,
também joguei esperança,
meu bocado de paisagem
frente às ilhas e às enseadas
de ser e existir.
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