Mestre Dito Fernandes também representa a religiosidade popular |
Esta
frase é do saudoso tio Maneco Mesquita, um caiçara que se preocupava muito com
a imagem, com a sua aparência pessoal. Explico melhor: nunca se viu ele sair de
casa sem estar devidamente vestido (roupas passadas, sapatos brilhantes, chapéu
impecável, lenço no bolso etc.). Nesse caso, ele se referia ao meu primo
Fernando, só que não me recordo mais do contexto, porque foi que ele afirmou
isso. Só a palavra heresia me
interessava. O tio Clemente foi o meu socorro.
Com
a paciência que lhe era peculiar, o titio, um santista devoto, me explicou que
heresia era uma palavra grega; queria significar escolha, preferência para
discordar de alguma coisa. Então eu deduzi que o Fernandinho, vulgo “Chico
Pomba”, era alguém questionador.
Mais
adiante, outro tio – o Tonico – deu a segunda versão: heresia era um pensamento
religioso diferente da doutrina da igreja católica. Herético era aquele que
merecia ser perseguido e punido porque não aceitava os dogmas da Igreja Católica
Apostólica Romana.
O
meu raciocínio neste assunto deu outros passos conforme eu cresci, fui lendo e
estudando. As pesquisas históricas e a literatura me ajudaram muito. Foi quando
eu passei a imaginar os meus antigos passando por apuros caso vivessem em outra
época, próximo dos inquisidores e de seus tribunais que apreciavam a morte pela
fogueira. O que seria das imprecações maravilhosas do Mané Bento? E as benzimentos
da tia Aninha, da tia Maria, da dona Josefa, do Mané Mariano e de tantos
outros? Como terminaria a tia Maria da Barra que ensinava o catecismo dizendo que Jesus tinha dois apóstolos por nome de Judas: o "Matadeus" e o "Carioca"? E o João Pimenta, o “incréu”, com o seu linguajar herético, que fim
teria? Da religiosidade popular, então, nada seria permitido!
Desconfio
que muitos desses caiçaras se desesperariam em saber que uma tal de Joana
D’Arc, depois de acusada de heresia, foi queimada viva em trinta de maio de
1431, na França. Nem sei se, devido ao isolamento no qual vivíamos, eles
souberam que, em 1920, o papa Bento XV a declarou santa.
Quantas
heresias! Ainda bem!
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