1984 - Ponta do Farol (Arquivo JRS) |
Em 1980, num meio dia de Sol ardido, eu estava no recenseamento na área da Ponta Grossa. Era outubro. Naquele dia o meu roteiro tinha se iniciado no canto da Praia Vermelha, na entrevista com o Dito Olho Azul, mestre da dança da fita da capela do Itaguá. Depois passei pelo povo da Anatilde, minha colega de escola, pela bica do morro onde era a casa do Ditinho Batatão e Hione. Logo alcancei as poucas casas do Cedro, onde o saudoso Zeca do Paru me guiou para os lugares dos parentes, às moradias dali. Ainda faltava a Ponta do Farol. A comadre Galdina apareceu por acaso, estava visitando alguém. A sua moradia era no Acaraú, vizinha da família Damásio, bem no meio do pessoal numeroso do Janguinho e Santana: caiçaras que marcaram a minha juventude. Ao vê-la, o Zeca, sempre com alguma tarefa em mente, pediu: "Gardina, faz o favor de acompanhar o Zé Ronaldo até as casas da Ponta, para fazer a pesquisa que é preciso". E assim subimos e descemos morros naquele calor bravo. No percurso encontramos um caminhão pipa. Ela me explicou: "A água dali é pouca. Por isso sempre vem um caminhão cheio de água para serventia dos moradores, de quem está por ali. É tudo turista, mas tem duas famílias que servem de caseiros. Se fosse só pobre, eu duvido que a prefeitura fizesse isso. Quem conseguiu esse serviço foi a dona da casa maior, gente do Abreu Sodré, que foi governador do nosso Estado. Hoje tem tem mais obras novas por lá, você vai ver mais construções. O caminhão tem vindo mais vezes por isso".
De fato, recenseei apenas quatro casas. Vislumbrei para os próximos anos mansões por debaixo daquele mato todo. Após a última casa, a comadre me convidou: "Já que estamos aqui, vamos até o farol. Dizem que está reformado, mais bonito. Ainda não fui lá depois disso". Lógico que eu ansiava em ver a famosa Ponta Grossa do Farol, o tal farol. E lá chegamos: uma obra simples, de onde se avistava um mar imenso. O finado Dário Barreto, caso estivesse conosco, na certa exageraria: "Quando o tempo está bem limpo, sem nenhuma cerração lá longe, daqui a gente é capaz de avistar o outro lado, a terra dos africanos". Sentamos ali para prosear desfrutando da linda visão. De repente um barulho veio vindo pelo mato, balançando galhos mais altos das árvores. Novamente aquela maravilhosa mulher me acalmou: "É mono. De vez em quando tem um bando deles que passa por aqui. O povo daqui está acostumado. Papai, que Deus o tenha, dizia que eles vem de longe, da serra, porque sentem saudade do mar, do cheiro da maresia e do barulho das ondas na costeira. É sempre neste tempo, quando tem mais caraguatás maduros. Vamos ficar quietos, só reparando no jeito deles. Macaco parece com gente, né?". O bando chegou, mais de quinze deles entre grandes e pequenos. Um deles se destacava. Ao nos perceber, deu uns pulos na nossa direção para nos examinar melhor, de perto. Permaneceu ali alguns minutos, na distância de cinco metros, sobre uma pedra. Depois soltou um som como se acalmasse os demais e foi tranquilamente se juntar ao bando que atacava os cachos de caraguatás. Impressionante! "Aquele que veio até nós é o capelão, quem comanda os outros. Repare que tem a barba a mais grande e bem ruiva, parecida galhada de aroeira madura. E olha aquele tamanho de gogó!". Fiquei devendo mais uma lição para a comadre Galdina. Quanto privilégio meu em conviver com essa gente toda!
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