segunda-feira, 21 de setembro de 2020

ERA GARNÉ

 



Baguary de Fora (Arquivo JRS)

    O mar estava ali, bem na porta. Comida também tinha, era o que bastava para as forças necessárias de cada dia. A pinguinha sempre surgia de algum lugar, trazida por alguém para distrair a vida dos pescadores. Ali Garné vivia o seu tempo não sei por quanto tempo, pois desde sempre eu tenho a lembrança dele sendo pescador naquele lugar, no pedaço de costeira conhecido como Baguary de Fora. Outros parceiros vez ou outra lhe faziam companhia, dormiam por ali.

    Desde sempre os pescadores usaram o Baguary como referência de pesqueiro, com bons parcéis e tocas fantásticas. Lugar de garoupa, de sargo e de tantas outras espécies cobiçadas por quem vive do mar. Há muito tempo a pesca de cerco foi instalada ali. Hoje não tem mais. Na falta de praia, uma estrutura (estivado) feita em paus roliços sobre as pedras da costeira serve de rampa às canoas, onde sobem e descem para a água, em busca dos peixes. Dois caminhos garantiam o acesso ao Baguary: um do alto do morro do Cedro e outro da Ponta Grossa, quase chegando no Farol. Quer um lugar bonito? Deseja sentir melhor a natureza? Recomendo, dentre outros, o Baguary de Fora, uma formação de relevo diferente. Tio Genésio dizia que baguari é coisa que não está de acordo. Quero entender que significava algo que destoa daquilo que era normal. No caso, entre um amontoado de rochas resistentes à força do mar, um ambiente diferente se formou. Árvores grandes, plantas rasteiras e até coqueiros se fizeram aparecer a partir de condições que pareciam impossíveis à vida. É certo: a natureza insistiu muito para se fazer daquele jeito, naquela beleza sem igual.
    
    O percurso da Ponta Grossa, a partir do Canto do Acaraú,  sempre me agradou muito. Andei bem por aqueles morros e costeiras desde antes dos vinte anos de idade. Vi as modificações acontecendo (e continuam!). Por vezes, de repente, punha a mochila nas costas, me despedia da mãe e lá me ia na caminhada. Quase sempre levava café, açúcar e pão para um café durante a prosa com o Garné e possíveis companheiros do Baguary (Zeca, Bidico, Tico, Jango...). Neste ano, meses atrás, Garné se foi. A paz daquele lugar agora é outra, sem o amigo de tantas prosas, das boas risadas da Era Garné.

    

    

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