Praia Grande do Bonete, vista do Morro da Bidu (Arquivo JRS) |
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Ainda no
começo do século XX, quando nem estrada de rodagem existia ligando o nosso
município com os outros vizinhos, a pesca e a roça ocupavam quase todo o tempo
dos caiçaras.
No tempo das tainhas, de maio em diante, todo mundo ficava afoito, à espera dos grandes cardumes. “Tempo de
fartura aquele!”. O Adelino, da Praia Grande
do Bonete, tinha uma grande rede, muito especial para os grandes cardumes.
Todos tinham seus quinhões após os compensadores arrastos.
Do outro lado
da Baía da Maranduba ficava a Praia da Caçandoca, terra do Vovô Estevan Félix.
Era costume do pessoal dali acender uma fogueira e produzir bastante fumaça
avisando da chegada das tainhas, resultando na descida imediata das canoas e da
rede liderada pelo Adelino. Também em ocasiões de festas, eles se comunicavam
com sinais de fumaça.
Devido à
religiosidade do meu povo caiçara, a cada lance de tainhas, a maior delas, chamada de tara, era separada e vendida. O que se arrecadava ia para a santa (ou
santo) que protegia o lugar, que era festejado na praia ou dava nome à capela.
No caso da Praia Grande do Bonete, além de São Sebastião, em janeiro, também se
festejava Sant’Anna em julho.
Um dos
companheiros de pesca do Adelino era o João da Vargem, cuja amante era a
Santana, gente do Jacundino da
Caçandoquinha. Ele não perdia nenhuma ocasião para uma visitinha rápida.
“É para tirar o atraso, né?!”.
Após o lance
do cardume na praia da Caçandoca, conforme o costume, o Adelino jogou a maior
tainha na proa. “Esta é para a Sant’Anna”. E saiu para um gole de cachaça na
Armazém do Zé Félix, o tio do vovô.
Ao chegar na
canoa e ver aquela bitela separada na proa, o João da Vargem quis saber para
quem era. De pronto escutou: “O Adelino separou para a Sant’Anna”. No instante
ele pensou: “Ah danado! Então ele também está querendo a mesma mulher?! Eu vou
antes dele levar esse peixe!”. E assim o fez.
Ao voltar para
a canoa, notando a falta da tara e perguntando aos companheiros, esta foi a
resposta: “O João da Vargem levou para a Santana. Você não falou que era para
ela aquela tainha?”.
Que confusão!
Daquela vez a santa não levou a melhor tainha. Quem saiu ganhando foi a fogosa
Santana da Caçandoquinha.
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