terça-feira, 3 de setembro de 2013

BELINHO ROCHA

O olhar do caiçara Hilário, da Praia Grande do Bonete (Arquivo JRS)

          Nascido e criado na Praia da Enseada, Belinho (Manoel Belo da Rocha), há muito tempo estabelecido no coração da cidade de Ubatuba, está prestes a completar noventa anos. É sempre um prazer encontrá-lo defronte a sua casa, na Rua Gastão Madeira. Prosa boa está ali!.

        Numa ocasião recente, enquanto juntamente com os filhos Maria e Estevan eu aguardava a minha esposa de uma consulta médica, o Belinho passou a detalhar a sua infância de caiçara, num tempo anterior ao turismo. É sempre muito interessante olhar dessa geração! Afinal, ele nasceu em 1924, numa época em que nenhuma rodovia nos ligava às cidades vizinhas. Conversa vai, conversa vem... a fome foi apertando (já passava das treze horas) e o meu filho quis algo para enganar o estômago. Foi quando a Rosiete, filha do Belinho que engrossava a prosa, insistiu poucas vezes para que o Estevan fosse almoçar: “Vamos lá! A mamãe começou a almoçar agora! Tem arroz, feijão, chuchu e carne moída”. E lá se foi ele puxado pela agradável mulher. Que acolhida!

             Para homenagear os Rocha, conto agora uma passagem da minha infância, quando éramos vizinhos do austero Maneco Rocha, tio do Belinho, na Praia do Perequê-mirim: ele tinha um único neto, filho do Benedito e da Santina. Os dois tinham que trabalhar. Por isso sobrava para o avô cuidar do recém-nascido após o almoço. Era o “xodó do vovô”.
            Além de ter uma voz rouca e possante, o Maneco Rocha era bravo e amedrontador. “Parecia uma trovoada quando falava”. Então, ao passar no caminho perto da sua casa, a gente, criança ainda, fazia o mínimo de barulho. Entre as árvores (principalmente paineiras, cambucazeiros, laranjeiras e jaqueiras), ficava o seu terreiro bem cuidado. A passarinhada fazia festa! Num certo dia, distante mais de cinquenta metros da casa do homem, eu e o Vitinho levamos um susto com a voz do recente vovô. Era como se uma trovoada forte repetisse “nana nenê, nana nenê, nana nenê...”. Naquele instante o Vitinho Coimbra exclamou:

                - O coitadinho não dorme nunca com um barulho desse! Imagina isso em cima da criança?”. Eu só acrescentei:

                - Nem não dorme! Desmaia, então?

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