quinta-feira, 23 de junho de 2011

“Raposa velha que ele era!”


            O velho Joaquim Amaro adorava parar para prosear, sobretudo quando eu estava construindo a minha casa. Nem preciso dizer que a recíproca era verdadeira.  Numa dessas ocasiões, já cansado de chapiscar parede, ele apareceu; foi quando lhe contei  sobre o que os ingleses pensaram para resolver a questão do assoreamento da barra do rio Grande. Isso há muito  tempo!  Nem precisei explicar o tal de corta-rio, porque assim ele interferiu:
         - O sei bem o que é isso, Zé! O Moravek, que se fez dono de um punhado de terra que não era dele, também fez isso, bem aqui onde nós estamos!”.
         Fiquei admirado, até porque eu conheço muito pouco do referido personagem. Quis  saber mais dessa novidade. E ele continuou (agora mais animado por deve ter percebido os brilhos nos meus olhos):
         - Foi o seguinte: este loteamento (Bosque dos Coqueirais) existe porque o homem foi astucioso, soube se aproveitar de situações que outros não tinham tanta ousadia, nem queriam mais daquilo que tinham. Também existiu sempre entre as pessoas daqui o respeito pelas coisas do jeito que Deus fez.
         Então, por curiosidade, eu o apressei. O que será que levava o velho a dar voltas na novidade? Tenho a impressão que isso não passou despercebido, porque a fala a seguir revela a sua percepção.
         - Calma, Zé!  O que ele fez foi mais ou menos aquilo que você disse dos ingleses. Só que não foi pensado numa questão da cidade, mas sim no seu bolso, em como podia aumentar ainda mais o seu patrimônio. Sabe aquela curva do rio repentina no fim desta rua (das Palmeiras)? Você não acha estranho isso? Tem uma área plana logo a seguir, mas a água nervosa da cachoeira prefere tomar outro rumo?
         Não pude deixar de pensar nisso pela primeira vez. É mesmo!
         - Então vou explicar melhor:  o Moravek, raposa velha que ele era, percebeu uma área gratuita, beira de rio preguiçoso, cheio de voltas, zona de gamboa. Resolveu endireitar tudo: abriu uma vala desde a pedra da Toca da Onça até o pé do morro da Carçada; depois encheu de terra, pedras e muitas outras tranqueiras naquele lugar ali (aponta o fim da rua das Palmeiras). Então, foi só deixar a força das águas fazer o resto! Entendeu?
         Entendi muito bem! Daí relacionei os vários pontos  baixos por todo o loteamento, onde sapos abundavam. É isso mesmo! Do corta-rio surgiu o loteamento onde moram tantas pessoas. Tenho a impressão que é o único lugar realmente planejado no bairro do Ipiranguinha.

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