É
dando maior importância a determinados aspectos, coisas que lhe
convém, que cada indivíduo se compõe em grupos sociais, em
instituições que com o tempo se fortalecem e se sobrepõem a outros
indivíduos e grupos, podendo até escravizar populações inteiras.
Do
lado paterno, eu descendo de Estevan Félix, da
Caçandoca, filho
de Francisco Félix (vitimado pela gripe espanhola no início do
século XX). Diziam
que seu bisavô casou-se com uma caapora, ou seja, uma índia
aprisionada nas matas. Portanto,
a história
mais remota diz que a nossa
origem
está em
uma caapora. Ainda:
os Félix, de Ubatuba, são da linhagem de três irmãos que vieram
da Bahia: um fixou moradia no Rio Escuro, outro no Sertão da Quina,
e o terceiro na Caçandoca, onde também nasceu meu pai e
seus ascendentes.
Lendo
a obra de Milton Guran – Agudás – achei passagens interessantes,
que podem até ter relação com os Félix que vieram, ainda no
século XIX, parar no nosso município. A palavra agudá
vem, provavelmente, da transformação da palavra ajuda,
nome português da cidade de Uidá, no Benin (África), por causa do
forte português da referida cidade, chamado de Forte São João
Baptista da Ajuda, construído em 1680 por Bernardino Freire de
Andrade, governador de São Tomé e Príncipe.
Em
francês, a língua corrente no atual Benin, os agudás são
chamados e se autodenominam simplesmente por “brésiliens”. A
maior parte dentre eles, sem dúvida, é constituída por
descendentes de traficantes ou de comerciantes brasileiros ou
portugueses estabelecidos nesta costa, ou ainda, por descendentes de
antigos escravos retornados do Brasil.
A
importância política da presença brasileira na região desde o
começo do século
XIX, com o retorno dos antigos escravos do Brasil, em consequência
da deportação de centenas de participantes da grande revolta [dos
Malês] de 1835 na Bahia, pode ser convenientemente ilustrada pelo
papel desempenhado por dom Francisco Félix de Souza, o todo poderoso
Chachá, traficante baiano, nascido em 1754, filho de pai português
e mãe indígena, uma
caapora.
Ele exerceu imenso poder sobre toda a Costa dos Escravos na primeira
metade do século XIX.
Prova
irrefutável do prestígio e da importância política de Francisco
Félix de Souza no reino do Daomé foram as homenagens a ele
prestados pelo rei Guezô ocasião de sua morte, aos 94 anos de
idade. Tão logo recebeu a notícia do falecimento do seu amigo,
ocorrido em oito de maio de 1849, Guezô enviou a Uidá dois de seus
filhos, à frente de um destacamento de oitenta amazonas, para
realizar as cerimônias tradicionais que duraram vários meses. Caso você vá ao Benin, visite o "Quartier Brésil", local onde até hoje prevalece a influência direta dos descendentes dos sessenta e três filhos reconhecidos e batizados desse brasileiro do passado. Enfim, essa história de pai português e mãe indígena pode ser a
mesma da caapora que é parte de mim herdada dos Félix. Meu pai? Leovigildo Félix dos Santos!
Tio
Chico Félix, nos desvarios da “mardita branquinha”, dizia assim:
“Os
nossos antigos têm rabo preso no contrabando de pretos das terras
distantes da África”.
É, pode ser mesmo!
Em
tempo: os agudás, os
“brésiliens”
são, hoje, 5% da população beninense.
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