segunda-feira, 21 de outubro de 2019

LIÇÕES PERNAMBUCANAS (II)

Arte da Gal (Arquivo JRS)

Meu primeiro sindicato (Arquivo JRS)


               Eu tive oportunidade de conhecer o Mestre Paulo Freire, em 1989, por ocasião da gestão da prefeita Luiza Erundina, na capital paulista. O MOVA (Movimento de alfabetização de jovens e adultos) estava totalmente imbuído nos princípios desse professor pernambucano, que passou um bom tempo exilado, se doando a uma boa causa em outras terras: contribuir com a liberdade em seu sentido mais amplo. O seu método de alfabetização estava -e continua! - em perfeita harmonia nesse sentido. Assim, ao se tornar secretário da educação na citada gestão, logo implantou o MOVA. Os voluntários, empolgados pelo ideal, geralmente eram estudantes e lideranças comunitárias. Os ambientes de atuação eram os mais diversos possíveis. O meu era no canteiro de obras,  junto aos operários, camaradas do cotidiano.

               Após um dia estafante, vários desses trabalhadores ainda mostravam disposição para se alfabetizarem. A cada quinze dias, acontecia a reunião dos monitores, das lideranças, onde se partilhavam experiências, se aprofundavam no Método Paulo Freire. No meu caso, as minhas anotações eram os relatos dos camaradas:

               “O  Zé ‘Paraná’, servente de pedreiro, veio da roça, de onde sente muita saudade. Sempre está cantarolando músicas sertanejas. Eu, conforme vou escutando suas cantilenas, anoto as palavras significativas: elas se tornarão geradoras, serão pontos de partida para o nosso próximo encontro. Por exemplo, de tanto escutá-lo cantando a Grande esperança, de Chico Rey e Paraná, escolhi estrofes inteiras para serem trabalhadas. A primeira é esta:

     A classe roceira e a classe operária/ ansiosas esperam a reforma agrária/ sabendo que ela dará solução/ para a situação que está precária./ Saindo o projeto do chão brasileiro/ de cada roceiro ganhar sua área/ sei que na miséria  ninguém viveria/ e a produção já aumentaria/ quinhentos por cento até na pecuária”.

               Conversando sempre, sério ou descontraído, eu provocava o ‘Paraná’, por exemplo, dizendo que a música preferida dele era devido a um dos autores ser o Paraná. E ele: “É, pode ser”. E Chico Rey? “Não conheço”.  Eu proponho conhecer um outro, com nome parecido, o Chico Rei, escravo de Ouro Preto, do tempo onde o ouro movia o Brasil. Então, no próximo encontro com os demais, você pode encaminhar esse assunto, esse tema. Que tal? “É um bom ponto para avançar nas nossas aulas. Tá feito!”.

               E assim, com o passar dos temas  - e do tempo! -, os amigos da obra, com certeza, foram alfabetizados, avançando na autonomia de pensamento, se libertando da dominação consolidada e gerando a maturidade política. 

                   Valeu, amigos e amigas! 
                   Viva Paulo Freire!

Nenhum comentário:

Postar um comentário