quinta-feira, 10 de outubro de 2019

AMIGO IRMÃO



Mané Gaspar, Luzia, Valdi e Maria. E o bebê Luciano (Arquivo Galo)

           O Dito, em suas memórias desde quando chegou ao Sertão da Quina, deixa a gente perceber que se fez amigo de todos. Hoje, ele expressa os seus sentimentos pelo saudoso Valdi do Dioclécio, meu vizinho do Sapê. Os outros irmãos (Toninho e Vaudi) morreram bem jovens. As irmãs e o Maguinho estão por aí, na luta. O pai (Dioclécio) era pedreiro, construtor que morava perto do Tonico, do João Firmino e do tio Chico. Naquele tempo, me lembro dos outros nossos vizinhos: Andrelino, Nié, Deolindo, Zé do Prado, Livina, Totô, João Paulo… Ah! Quanta gente boa eu tive o privilégio de conviver! Também trabalhei com o Valdi em várias obras. A última foi por ocasião do telhado da igreja católica do Sertão. Ele olhava para o João, tão gordo quanto ele, e dizia já gargalhando: “Gente gorda é muito feia, né João?”.




AMIGO IRMÃO

          Existe um ditado popular que diz o seguinte: “Amigo a gente escolhe, parente é Deus que dá”. No caso desse meu amigo, aconteceu diferente: foi um amigo que Deus me deu e um irmão que me escolheu.

        Seu nome é Valdi Ramos de Araújo. Valdi mesmo! (Para ser autêntico e original como era o homem por trás do nome). Para quem o conhecia desde criança: o Valdi do Dioclécio.

         Caiçara como poucos, no jeito de falar, andar, de agir e pensar. Todas essas coisas inerentes ao homem. Porém, antes desse homem, havia o pai de família e o melhor amigo que se pode ter.

          Pai de família daqueles à moda antiga; austero, mas carinhoso; sério quando era preciso. Só que, no resto do tempo, brincalhão. Desses de riso farto e jovial. Sujeito trabalhador, de dar exemplo, e, acima de tudo, honesto. Desmentia a preconceituosa máxima que “caiçara não gosta de trabalhar”.

           A respeito das relações de amizade, nunca conheci ninguém que falasse mal dele. Quem não era amigo, respeitava-o. Falar do Valdi como amigo é muito fácil, pois só tenho lembranças boas desde quando o conheci, no fim de 1986, ano em que vim parar aqui, em Ubatuba. Não tenho nenhuma lembrança ruim do nosso convívio, nada que coloque em dúvida a nossa amizade.

            O Valdi era daquelas pessoas grandes. (Porque quem tinha um coração grande, tinha de ser grande!). Nunca me esqueço das nossas pescarias, pelo fato de ter aprendido muito nessas ocasiões, e também pela alegria, pois ele nunca perdia a chance de rir e fazer os outros rirem.

            Hoje as pessoas falam muito de consciência ecológica. Ele, naquele tempo, tinha essa consciência. Nós nunca deixamos um siri, um peixe miúdo na areia. Depois de escolher os maiores, íamos até ficarmos com água pela cintura e soltávamos todos os que não tinham bom tamanho.

         Foram sete anos inesquecíveis, de convivência quase diária. Afinal, eram raros os dias em que ele não parava no mercado onde eu trabalhava. Chegava sempre rindo, pedia um pão, cem gramas de mortadela, uma coca… E haja conversa!

        Lá se vão vinte e seis anos que o Valdi se foi. Mais um que Deus me emprestou e depois levou porque achou que devia levar. Acho que Deus estava precisando de alguém que fizesse o povo do céu dar risadas.

        Saudades do meu amigo irmão. Ah, Valdi, gente gorda não é feia, ainda mais quando é nosso amigo!

Benedito Evangelista Filho (Galo)

























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