Da janela da Idalina (Arte em casa- JRS) |
"O aniversário de Ubatuba que
hoje, 1967, se comemora, vem encontrar a cidade refazendo-se do segundo golpe
que recebeu desde o seu nascimento. A história de Ubatuba registrava, no
passado, o golpe que atingiu a cidade próspera e rica, atirando-a durante mais
de meio século na pobreza e no esquecimento. Aconteceu quando uma estrada de
ferro ligou Santos a São Paulo e outra estendeu seus trilhos desde a Capital
até o Vale do Paraíba. Na luta entre o trabalho do homem e aquele feito por
máquina, vence sempre este.
Ubatuba era porto marítimo, mas o
café que aqui chegava para exportação, viajava em lombo de burro desde a
fazenda até o mar. Homens a pé ou a cavalo precisavam acompanhá-lo de perto, carregá-lo
e descarregá-lo da tropa. Um dia o trem de ferro chegou com três, quatro ou dez
vagões, para transportar, em uma só viagem rápida e segura, aquilo que nem mil
burros poderiam levar durante um mês. Foi o fim. Ou, antes, o começo do fim. O
fim verdadeiro chegou quando a estrada de ferro Ubatuba-Taubaté, que os ubatubanos
haviam iniciado para competir com a “Inglesa”,
suspenderam suas obras, falindo. Essa falência, levando de roldão todas as
economias da gente da terra, deixou-a sem mais condições de luta.
E o golpe do destino feriu de
morte a terrinha que vira em suas praias os vultos inesquecíveis de Nóbrega e
Anchieta, que ficou extenuada, sem sangue e sem alma para lutar. Os que tinham
ainda coragem para disputar um lugar ao sol emigraram. Aqui ficaram os velhos,
doentes, os vencidos, vendo caírem os prédios onde gente alegre e rica vivera
esperanças e grandezas.
Agora um novo golpe atingiu a
cidade. Quando tudo indicava um futuro risonho, próspero, cheio de hotéis de
luxo e de turistas ricos, de automóveis de último tipo e de aviões a jato, uma
chuva, uma simples chuva veio relembrar ao homem, logo depois de um Carnaval,
que ele não passava de pó e ao pó voltaria; a Ubatuba, que ela, como criação do
homem, também não passava de pó. Desta vez, porém, a cidade reagiu, seus homens
lutaram, foram buscar no fundo das suas almas as reservas de coragem, e
enfrentaram a dureza da hora triste com a determinação de vencer. [...] A prova
serviu para unir os seus filhos. Como se unem irmãos desunidos à beira do
caixão do pai ou da mãe, unidos multiplicaram as suas forças, venceram. E as
lembranças dos dias tristes do passado servirá apenas para a história que os
avós contarão aos netos nas noites de chuva. ‘Uma vez choveu tanto, mas tanto,
que a serra desabou... em Caraguatatuba’. Os meninos ficarão quietinhos ouvindo
a chuva cair enquanto as pálpebras irão
ficando pesadas”.
Quem
escreveu isso? Ora, a nossa saudosa Idalina Graça!
Agora, já
madrugada, findo este com um verso do nosso fandango:
Companheirada é
hora da partida/
Deu meia-noite o
galo já cantou/
Eu vou cantar e dar a despedida/
Vamos embora que
o dia já clareou.
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