Pedras e água salgada para as frieiras. Prainha do Góis. (Arquivo JRS) |
Quando éramos crianças, só vivíamos descalços, correndo desde as costeiras até os morros. Acho que não existia caiçara de pés que não fossem cascudos e rachados. Disto veio o nome artístico do saudoso João de Souza, o nosso Poeta do Pé Rachado. Porém, uma doença era comum: a frieira. Era uma micose brava; atacava geralmente entre os dedos dos pés. Pelos terreiros, mais entre as bananeiras, encontrávamos uns vermes minúsculos que andavam em montes, uns escorregando sobre os outros: eram os bichos-frieira. Em tempo: na década de 1970, o doutor Francisco Jeronymo Salles Lara, patrão do meu pai, um pesquisador da USP (Universidade de São Paulo), pagava aos caiçaras por esses bichos e levava para estudá-los. Também recompensava os coletores de folhas para alimentar os tais bichos. A minha curiosidade me fez pesquisar a respeito disso:
A Rhynchosciara americana é uma espécie de mosca. Trata-se de um inseto díptero encontrado em regiões litorâneas brasileiras. Durante grande parte de sua vida apresenta-se em forma de larva. Um mesmo cruzamento de Rhynchosciara resulta em cerca de 250 a 400 larvas de um único sexo que se desenvolvem sincronicamente, até formarem um casulo comunitário dentro do qual sofrem metamorfose e chegam então à fase adulta, virando moscas. A Rhynchosciara se alimenta de fungos e contribui para a decomposição de matéria orgânica no solo. É um inseto que não está relacionado a nenhuma transmissão de doenças e, erroneamente, é relacionado à transmissão de frieira. Assim, no litoral de São Paulo, por exemplo, a espécie chamada popularmente de “bicho da frieira” foi quase extinta, pois a população nativa queima os grupos de larva equivocadamente. (Fonte: Wikipedia).
Tai! nós demos a nossa contribuição para a ciência! Quem quiser saber mais pode buscar nos artigos científicos; fazer bom uso da internet.
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A frieira era algo contraditório porque a coceira era desesperadora e prazerosa ao mesmo tempo. Só se parava de coçar quando começava a sangrar. Talvez por isso que o meu avô Armiro, quando perguntávamos a respeito de um casal tão desigual (exemplo: ele extremamente feio e ela bonita demais), ele logo respondia: “Quem há de resistir quando a comichão sentir?”. Nas pedras das costeiras, salgando com águas constantemente, estavam os melhores lugares para castigar as frieiras.
Mais tarde, aprendendo no colégio sobre o movimento por nome de concretismo, poesia concreta etc., escrevi a...
COCEIRA CONCRETA
Meu dedo passa discreto,
Forma na parede mofada
Um sinal refletido pela luz:
Não é pretexto, nem texto;
Não é alguém, nem ninguém;
Não é você, nem você é.
Agora olho...olho...
Não vejo nada!
A vela chegou ao fim;
Na lamparina não há querosene;
Da lua nenhuma claridade chega,
Pois a “cheia” tá longe.
Então vai chegando:
Uma madorna,
O sono pesado
...E o ronco indiscreto.
Meu dedo coça,
Desliza sobre o corpo;
O cansaço da posição me agita.
Um galo quebra o encanto
Do meu discreto acalanto.
Eu sinto...Sinto muito!
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