domingo, 20 de fevereiro de 2022

VIAGENS E AMIZADES



Arte em casa - Arquivo JRS


    - José Simão. Prazer. Mas me conhecem como Simão.

    - Prazer. Zé Ronaldo. E, conforme a rima: Zé de cá e Zé de lá/ Ribeirão passa no meio/ Zé de lá dá um suspiro/ Zé de cá suspiro e meio. O senhor pode ir lá para o começo deste pessoal que está esperando, idoso tem preferência.

    Ele deu uma gostosa gargalhada.

   - Não precisa não. Ainda mais que não tem quase ninguém na fila

    Assim começa mais uma prosa num belo dia começando. Simão estava no terminal de ônibus precisando de informações, querendo saber quais linhas passam pela praia da Enseada. Eu explico rapidamente e pergunto de onde ele é.

   - Sou de Cerquilho, interior do Estado. Estou numa excursão da terceira idade. Viemos em dois ônibus; chegamos ontem à noite no hotel Costa Azul, na praia da Enseada.

   - Ah! Eu conheço bem esse hotel. Deve existir há mais de quarenta anos. E ali, perto do morro.

   - Isso mesmo. é lá! Eu tenho de descer no primeiro ponto assim que passa um morro grande, depois de passar por duas praias. Vou prestando atenção, gravando o caminho. É meu costume, nesses passeios que faço, procurar conhecer o centro de cada cidade e localizar uma casa lotérica para fazer uma aposta. Em todo lugar eu repito isso. Acabei de fazer a minha aposta, agora estou voltando para o hotel.

   A minha linha, cujo destino era Tabatinga, também servia a ele, passava pela Enseada. Embarcamos juntos. E aí, desde o momento do embarque até a chegada ao destino desse nosso visitante, desse turista, eu senti a maior satisfação em ir lhe explicando coisas da nossa cidade. Primeiro lhe contei do hotel que é do tempo da minha adolescência. Zé Emboava foi mestre da obra; Caninha trabalhou de pedreiro ali. Depois dele acabado, Dona Celeste, Jango Graça e Zé da Nhanhã foram funcionários ali até se aposentarem. Esses falecidos fazem parte dos meus saudosos. De vez em quando me recordo de suas histórias e causos. É que eles paravam no bar e mercearia onde eu trabalhava, sempre precisavam de alguma mercadoria e nunca se recusavam a "um dedo de prosa". Adoro, desde criança, ficar ouvindo essa gente mais velha! Era o que eu estava fazendo naquele momento, ouvindo um viajante de outra terra.

   - Eu não conheço Cerquilho, mas já ouvi falar.

  - Eu também não conhecia Ubatuba. Esta está sendo a oportunidade, talvez primeira e única. Na verdade, a excursão estava prevista há dois anos, mas aí veio a pandemia e foi adiada. Eu participo do grupo da terceira idade da cidade, sempre estamos viajando, conhecendo outros lugares. A anterior foi no mês passado, ficamos em Itanhaém. O litoral de lá, mais ao sul, é bonito. Só que aqui é muito mais! Eu só estou sentindo falta de mais movimentação, de mais comércio perto de onde estamos hospedados. Ontem, assim que chegamos e nos acomodamos, alguns dos nossos queriam dar uma volta, visitar alguma feirinha para comprar artesanato e recordações, mas foram informados que não acontecia nada nos arredores.

  - É, não tem mesmo. É pouca coisa ali, na Enseada.  Caso queiram sair após o anoitecer, na avenida da praia, no centro da cidade, tem uns atrativos. Também aqui (indicando a via marginal da rodovia, na Praia Grande) tem uma boa movimentação, uma vida noturna. Creio que irão gostar.

   Nesse momento pensei na falta de uma Secretaria de Turismo que elabore isso de oferecer guias turísticos aos estabelecimentos de acolhimento em nossa cidade. O referido hotel poderia ter uma lista de nomes, indicar alguém, apresentar a alternativa para melhor aproveitamento da estadia do grupo. Imaginei pessoas capacitadas para acompanhar visitantes, sendo lhes útil ao máximo, dando a conhecer a história da cidade e seus principais atrativos. Tenho a certeza de que essa medida tão simples pode atrair mais gente, incrementar mais o turismo. Quando estávamos no Morro do Maciel, avisei:

   - O próximo é a sua parada, Simão. Foi um prazer lhe conhecer e ter esta prosa. Aproveite bem estes dias em Ubatuba.

   - Quem agradece sou eu! Agora, caso o pessoal queira, já posso servir de guia numa saída noturna depois de um dia de praia. Se aguentarem, né?

   Nos despedimos. Ainda pude avistar, na descida do morro, os dois ônibus fretados pelo pessoal da terceira idade de Cerquilho, estacionados no pátio do hotel. Eu estava feliz; sentia que havia colaborado com alguém e escutado outras histórias.


  

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