Meus rabiscos (Arquivo JRS) |
Quando eu era criança uma coisa
me impressionava ao ver o saudoso tio Francolino chegando na rodovia, no ponto do ônibus da Praia
Dura, vindo do Corcovado com um enorme saco de farinha de mandioca na cabeça,
indo vender na cidade: ele sempre estava totalmente suado, pingando mesmo! Assim
que acomodava a sua carga, ele tirava a camisa, pegava uma toalha que trazia na
sacola, se enxugava, dava um tempo e vestia outra camisa. (Detalhe: os nossos antigos
vestiam uma camiseta sob a camisa). Eu acreditava que jamais veria alguém suar
tanto. Também, pudera! Ele era obeso e a sua casa era longe mesmo, talvez quatro quilômetros dali. Era notável a
disposição deste caiçara que nos deixou faz tempo!
Vovô Armiro, falecido faz tempo, se dava muito bem
com o tio Francolino. Quase sempre ele também estava levando a sua carga de farinha
para vender no centro, depois de ter andado mais de sete quilômetros na estrada da Fortaleza. Naquele tempo, todos se davam bem, conversavam bastante,
contavam causos e davam risadas contagiantes. Era normal, pois se conheciam desde os tempos
de criança, eram parentes, trabalhavam e festavam juntos. Eis uma particularidade dele que eu nunca imaginava. Segundo o vovô: “raramente
o Francolino não levava a sua viola na canoa quando ia para a pescaria. Conforme a cara do tempo, ela era embarcada bem protegida e dentro de um balaio de taquara. Seu
rancho era em algum ponto, rio acima, quase chegando na Folha Seca”. Estranho?
Estranho mesmo! Era paixão! “Numa ocasião, numa
pegadeira de espada depois da Barra, quase no Saco Grande, lá estava o
Francolino também. Todo mundo estava puxando peixe, inclusive ele. A certa altura, depois de retirar a linhada da água, pegou do saco a sua pequena viola paulista que
tanto estimava e nos alegrou com umas modas nossas daquele tempo. Era costume cantar duas ou três
delas; depois protegia o instrumento, guardava no balaio e voltava a
pescar. A gente gostava. Era uma alegria
só! Não demorava muito para alguém pedir mais cantoria. Quase sempre ele
atendia aos pedidos. Coisa comum era de mais gente, nas canoas que estavam por
ali, também entrar na cantoria. De uns tempos para cá, devido ao excesso de peso,
ele não pesca mais, mas continua tocando a sua viola em casa. O primo Jeú,
vizinho dele lá no morro, diz que é costume de um grupo se encontrar no serão, no
terreiro do Francolino, para as cantorias e prosas. Ele tem um grande
carinho pela sua viola paulista. Diz que, depois da mulher e da canoa, a viola é o sua maior devoção. O nome grafado nela logo que comprou numa viagem de promessa à Aparecida é: Minha santa".
Tio Francolino: pescador, roceiro e
violeiro radical! Tio Francolino: parte de nossas raízes! Só de imaginar as cenas eu ainda me emociono.
muito legal, conheci o seu Tio Francolino tenho até uma história com ele
ResponderExcluirBoa, Joban! Escreve também! Abração.
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