terça-feira, 26 de novembro de 2019

À SOMBRA DO IPÊ

Olha a abóbora!  (Arquivo JRS)

Posando com Papai Noel  (Arquivo JRS)

Arte em casa  (Arquivo JRS)



       Ali perto da estrada, debaixo do majestoso ipê plantado pelo saudoso pastor, eram três a prosear: o filho do Antônio Caolho, nascido depois da Eva, o mais velho do Dito Santo e o que lhe escreve, filho do Carpinteiro. O assunto principal era pescaria, depois de passar por assuntos de família e desse nosso lugar que cresceu tanto, onde quase ninguém já se conhece. Arrumar tempo assim é costume de tranquilidade, coisa de caiçara que muita gente nem faz questão nos dias de hoje.
         
            -   E o  seu irmão?

      -  Meu irmão agora é evangélico, tem raiva das imagens que eram da minha mãe. Depois que ela se foi, eu trouxe tudo para casa. Agora, se você for lá, verá na sala o oratório com alguns santos. Todos eram dela. Ela e meu pai eram católicos e morreram assim. Eu sigo eles, vivo me lembrando dos exemplos deles.

      -   Eu sei disso. Me lembro muito bem de como trabalhavam os dois. Quantas vezes tomei café com vocês, na casa da beira da estrada!?! O vizinho mais perto era o velho japonês. Mais ao fundo, debaixo da grande mangueira, era a casa da sua irmã e do Genésio. Coitado… Bebia tanto… Saudades deles e de tanta gente boa que partiu.

       -  E você? Cadê aquela moto bonita, antiga, CB 400, né?

     -  Ela tá ali, em casa. Fica na sala. Quase todos os dias dou partida nela, senão trava o carburador.

        -   Quando foi a última viagem nela?.

      -  Ah! Faz tempo! Há anos fui em Serra Negra visitar um amigo. Pousei lá para depois seguir até Mairiporã, entrar pelos caminhos da roça e visitar meu pai. No dia seguinte amanheceu uma chuva torrencial, grossa mesmo. Meu amigo ainda tentou me dissuadir de sair com aquele tempo, mas não conseguiu. Uma jaqueta e uma calça grossa era o meu agasalho. A chuva continuava do mesmo jeito, grossa que só. Quando peguei a estrada de barro é que senti a dificuldade. Pior foi quando a moto atolou até o motor. Depois de um tempo veio um cavaleiro e me ajudou, senão eu ficaria ali por muito tempo. Ao dizer que estava indo visitar o meu velho, Antônio Caolho, ele disse que o conhecia, mas que seria impossível porque a estrada adiante estava em piores condições, recomendando que seria bom voltar dali mesmo. Foi o que fiz. Poucos quilômetros depois, já no asfalto, continuando cair água na mesma pancada, a moto tava limpinha de novo, sem nada de barro. Seria a última vez que encontraria com o meu pai. Não demorou muito tempo, ele faleceu.

      -   O nosso amigo aqui, agora aposentado, tem mais tempo para pescar.

    -  Isso é verdade. Adoro pescar. Não é tanto pelo peixe, por gostar, mas pelo prazer da pescaria, pela paz junto ao mar. Geralmente vou depois do almoço para a costeira e só saio no serão, quando vai chegando a escuridão.

      -   É isso mesmo! Sempre ele deixa lá em casa uns peixes que pescou. A vizinhança se dá bem, todos se conhecem. Toda latinha lá de casa eu jogo por cima do muro dele.

      -  Eu vou ajuntando aqui e ali e depois vendo. Sempre rende o suficiente para pagar algumas continhas. Me pagam quatro reais pelo quilo. Agora vamos entrando, ver como está o meu quintal cheio de plantas. Ah! Tem uma abóbora reservada para você.

      -  Fiquem vocês aí porque eu preciso ir à feira comprar algumas coisas. Foi bom estarmos juntos. Foi bom rever você. Era uma criança quando foi morar no Perequê.

      -  Isso mesmo! Eu tinha sete anos.

     -  Até logo. Hoje você toma café com ele, mas na próxima é lá em casa. Vê se não demora.

       -  Até. Pode deixar, Cristino.

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