domingo, 7 de agosto de 2011

Batismo de maresia

               
              Verão distante; fim de tarde faltando  pouco para passagem do serão para a noite : momento de voo dos primeiros curiabôs.  A canoa balançava no ritmo do mar calmo. Na popa o meu avô Estevan; na proa eu. Tempo de pegadeira de tortinha, um peixe de largo, pequeno, bem gostoso quando frito.
                Depois de uma hora de pescaria, a balaio do centro da velha canoa de capurubu já passava da metade. De repente, começo a sentir uma sensação estranha: tudo roda. Só escuto vovô gritar:
              -Vomita na água! Vomita na água!
              E lá se foi o que restava no estômago. Mas não parou nisso: novas marolas, novos vômitos. Vovô ria tal como riu um dia, no passado distante, o seu pai. Esse era o Batismo na maresia dos caiçaras; sempre haveria um dia para alguém passar por ele. É ritual de gente do mar.
             O balanço vacilante, apesar do mar calmo, dava a impressão de ser imensas vagas de alto mar em situação tormentosa. Vem o cheiro (horrível!). Os arrancos se sucedem; o cuspe tem um tom verde espumante. Tudo arde; peço água ao vovô que continua a retirar peixe da água, quase enchendo o balaio. Pergunto a ele de onde vem aquele cheiro ruim.
              - É da maresia, Zezinho. Você tá mareado; só assim se percebe com o corpo a força do cheiro do mar. É o momento de voltar para a praia: só lá o corpo se cura. Recolha a poita.
            Dito e feito: ao pisar em terra firme estava curado.
            Depois de recolher a canoa ao rancho, aos primeiros que se aproximavam o vovô me apontava e dizia em tom de riso:
            - Pronto! Foi o batismo dele! Quem se deu bem foram as tortinhas: estarão empanturradas até amanhã.

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