Todos sabem que num relacionamento perfeito ninguém sai infeliz. Assim é com os bichos; assim é com os homens e as coisas. Ninguém também é ignorante a ponto de dizer que não precisa de nada e nem de ninguém para viver. Porém, com o progresso, chegou outra mentalidade: a de levar vantagem sem se importar com a situação do outro e das coisas, incluindo a natureza. Assim começa a competição danosa, o desrespeito e as desavenças. E o homem vai se afastando de uma sabedoria que se deu numa simbiose natural, espontânea. Ou melhor: vai perdendo a paz.
A partir desta linha de pensamento eu procuro proporcionar, sobretudo aos mais jovens, um contato com o conhecimento de nossos antepassados, da cultura caiçara (da sua formação e continuidade). Creio, atualmente, que a escola é o caldeirão que recebe os ingredientes de tamanha vitalidade, mas é preciso evidenciá-los.
Hoje escrevo sobre a casa de pau-a-pique: a casa dos antigos caiçaras.
Quem já teve a oportunidade de ver uma casa de pau-a-pique, entender a sua montagem, perceber que é totalmente ecológica? Ela leva uma sugestão prática, alternativa para a construção civil. Quem já fez um esforço para sentir o cheiro da madeira, do bambu, do cipó, do sapê e do barro?
A lição principal dos tempos das casas de pau-a-pique ainda precisa ser digerida por todos: o homem se dá à natureza (material) ao mesmo tempo e na mesma medida que esta se dá ao homem, sem jamais ser uma relação danosa, prejudicial, infeliz. Nisso me recordei de tantos momentos que já vivi, dos muitos pitirões (mutirões), das falas que jamais deixaram de ecoar em mim:
“Tá toda envarada. A jiçara veio do Morro da Anta, bambu é do Costão. Tudo devezado e cortado na lua certa. Jacatirão, tarumã, massaranduba... Foi tudo labrado. A timbopeva e o imbé foi cochado, tá cherando. A cobertura é arte do Bito Neve, do Girdo e do Tonico. Vai aturá até que tudo se acabe. Manhã bem cedo chega um mundaréu de gente pro pitirão. A comidoria e a bebida já tá garantida pra adespois do embarreamento. Notra semana é a veiz da casa do Lorenço da Ilha que veio pra terra; se cansô de vivê no Mar Virado”.
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