Não tem muito tempo que, nas
areias da praia do Perequê-açu, em Ubatuba, o meu filho, cavando um pequeno
buraco, encontrou um lindo anel de cobre. Também não demorou muito tempo para
perdê-lo. Era bonito, com gravações de motivos egípcios. Esse fato –ter
encontrado um anel - é que me fez recordar de outra situação que envolve um anel.
O personagem principal é Luizinho, um pedreiro, morador em barraco de obra, em
outros tempos, no Perequê-mirim. O
apelido dele no trecho era “Diabo Loiro”. Pela vida sofrida, pela idade que já
tinha naquele tempo, por tanto padecimento que o pobre passa, eu desconfio que o
Luizinho nem viva mais. O importante é que, em minha memória, ele continua
presente. Dele escutei a seguinte história que nunca esquecerei:
“O
que vou contar agora para você, Zezinho, escutei da minha finada mãe quando eu era jovem ainda. Trata-se de um fato que aconteceu com o meu avô. Ainda bem novo, ele se apaixonou por uma moça lá na cidade onde nasceu, no Ceará. Era
apaixonado, mas não tinha coragem de se declarar a ela, de dizer o quanto se sentia atraído para um
compromisso sério. Até comprou um anel
como sinal de disposição em se casar, caso a moça o aceitasse. Passaram-se
meses apenas em ensaios, pensando num jeito de revelar seus sentimentos, mas só
continuaram na amizade, ambos transbordando em timidez.
O
tempo foi passando até que, num belo dia, ele soube que a sua amada estava na
estação para embarcar no ônibus e ir para uma cidade bem longe, num outro estado.
Meu avô largou o que estava fazendo, pegou o anel e saiu numa carreira para o
local, como uma questão de vida ou
morte. Chegou tarde. A partir disso caiu em profunda solidão, sobretudo depois
de um mês, quando recebeu a notícia de que a sua amada tinha morrido num
acidente, foi atropelada por um carro na cidade grande. Aí foi que as coisas
pioraram.
Levou
muito tempo para o meu avô aceitar a situação e refazer os rumos da sua vida.
Casou, teve filhos e netos, ficou viúvo. Faz certo tempo que ele também já
faleceu. Agora, preste mais atenção, Zezinho: um pouco antes de morrer, ele
chamou a minha mãe, deu-lhe um anel e contou a sua história. A minha saudosa mãe
ficou tão emocionada! Ela nunca poderia nem imaginar aquilo tudo que o pai
guardava por tanto tempo. Ela, coitada, até chorou junto com o meu avô! Por
fim, o vovô recomendou que ela guardasse aquele anel e desse ao próximo filho
que estava para nascer, ao seu neto. Eu sou a criança que nasceu; fui eu quem herdei o anel do vovô”.
Em seguida, o Luizinho abriu a
mão cheia de calos, rachada pela argamassa, mostrando o anel. Me presenteou: “Agora ele é seu, Zezinho. Quero que você
aceite este anel porque eu não tenho mais ninguém por mim neste mundo”. Eu
me emocionei diante daquela figura que tantos não hesitavam em chamar de “Esponja”,
“Traça pernas”, “Desaprumado” etc. Mesmo meio sem jeito, guardei o anel. A vida
deu voltas, cada um foi pegando seus desvios, fazendo novas rotas. O Luizinho
se foi, o anel continua comigo, aos meus cuidados. “O que se opõe ao descuido e
ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais do que um ato; é uma atitude. Portanto,
abrange mais do que um momento de atenção. Representa uma atitude de ocupação,
preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro”.
(Leonardo Boff). A minha preciosidade,
“Joia do Luizinho”, permanece atada na cabeceira da minha cama desde aquele
tempo de adolescente, quando eu era balconista no Bar Orly (Bar do Severino),
no Perequê-mirim.
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