Final da colheita dos carás (Arquivo JRS) |
Inverno,
para nós caiçaras, tem um gosto especial por diversos motivos (tainha, festa
junina, fandango, festa do Divino...), mas o que importa hoje é falar dos
carás: roxo e moela. Fomos criados aguardando esta época do ano. Portanto, além
dos sabores em si, da sustância desses frutos da terra, tem ainda a reminiscência
dos momentos em família, da disputa em coletar pelas matas essas iguarias.
O
cará moela dá nas tralhas pelos galhos das árvores; o cará roxo dá na terra,
necessitando cavoucar com cuidado a cepa, de onde saem suas tralhas. É lá que
se encontra a grande preciosidade! Ambos
têm tralhas que se espalham nos galhos altos das árvores. O sinal que está no
ponto de colheita é quando as tralhas começam a secar nos muitos pontos, pelas
matas. Os nossos olhos foram acostumados, marcam os lugares nas antigas
tigueras, onde se encontram essas inconfundíveis tralhas. A gente fica na
espreita. Seus lugares, suas
localizações são conhecidas. Na verdade, uns passam aos outros essas
localizações, pois sempre houve partilha nas coletas. É por isso que o Antunes
não me deixa esquecer: “Já não é tempo de ir à estrada da Lagoa, no Morro do
Cará?”. A vovó Eugênia, nessa época recomendava: “Quem for à Pedra da Igreja
tem que esticar a pena até o Morro do Tatu para trazer cará”. Na casa da vovó
Martinha era moleza, as tralhas cobriam uma frondosa aroeira na porta da
cozinha.
Quando
a panela de cará estava na mesa, a vovó nos chamava para o café. Nunca faltava
alguém que perguntava rindo: “É o cará do Argelo?”. Ah! Quem não imagina de que
se trata, considerando nossas raízes culturais?
Neste
final de semana, conforme atestam as fotografias, cheguei ao derradeiro momento
desta safra no meu reduzido quintal. Agora é só replantar a miuçalha que nos saciará no próximo inverno.
Aos de fora digo que conhecer, mesmo parcialmente, é importante para respeitar
a cultura local e ajudar a preservar esta terra que tudo dá. E viva o cará do
Argelo!
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