quarta-feira, 29 de julho de 2015

O CAMINHO DAS ANTAS

Tia Aninha e seus santos (Arquivo JRS)


             Quando criança, morando na Praia da Fortaleza, a atração para tudo era muito grande, exceto para ficar uma manhã inteira sentado numa carteira escolar. Então, era comum eu ficar na classe, na verdade a sala da casa da Tia Martinha, apenas até o intervalo do recreio. Assim que dava, eu rompia o mato do entorno, pulava rio e valas e sumia dali. 
                Brincar, correr, jogar miringuito, descer o morro em totoa, brincar de roda de breque, fazer barquinhos, dar pelotadas, pegar camarão no balaio, mariscar etc. eram coisas corriqueiras, de cada dia, inclusive quando a chuva não estava grossa, sem trovão e corisco a brilhar a cada instante. Outra coisa sagrada era acompanhar os mais velhos nos roçados de mandioca,  de banana, de cana, de batata doce e outras iguarias tão necessárias à nossa alimentação.
                No morro da Fortaleza, desde a badeja até a mais alta grimpa, as roças eram a garantia de sempre ter algo a mais do que caça e pesca. As plantações do Vovô Armiro - e de outros caiçaras do lugar - se espalhavam nessas áreas, mas os dois eitos  mais distantes eram o Morro do Tatu e o Morro da Anta, onde uma cobra picou o Peri, o cachorro vinagre da família. Eu já contei noutra ocasião que o Tio Tião desceu correndo com ele e o tratou com ovo cozido. Quer saber mais, leia a postagem (Ovo cura, março de 2011). Ah! Outra lembrança boa desses roçados mais distantes era, nessa época do ano, a colheita de cará-roxo! Delícia, né? Pois é! Agora, o que pouca gente nova sabe é que, passando pelo Morro da Anta, existia um Caminho de Servidão (trilha) que ligava as praias da Fortaleza e Lagoinha. Que morrão! Isto quer dizer que, naquele tempo, os caiçaras do local preferiam este caminho em vez de circular pelo Caminho do Bonete.

                Vovô Armiro, também chamado de Zé Grande pela Vovó Eugênia para distinguir deste escrevinhador que era o Zezinho, dizia que muita gente seguia viagem a pé para Caraguatatuba e Santos por ali. Iam em busca de trabalho, de dinheiro nesses lugares. Quanta disposição! Era por isso que, quando alguém se lastimava das condições do nosso lugar, havia um dizer dos antigos: “Não seja infeliz. Siga o Caminho das Antas”. 
        Numa tarde, estando eu na casa da Tia Aninha, escutei: "Fiquei sabendo que você tem fugido das aulas, Zezinho. Não faça mais isso. Estude para não seguir o Caminho das Antas”.

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