Praia do Perequê-mirim (Arquivo JRS) |
Na
Praia do Perequê-mirim, na casa da Dona Belinha, foi onde eu conheci a ave chamada
arara. Fiquei encantado por ela. Por isso, sempre que podia, eu adentrava àquela chácara
maravilhosa, que começava no jundu e chegava até a nossa escola e na pista (a
estrada Ubatuba-Caraguá). Diziam que o finado marido dela tinha sido o
engenheiro responsável pela obra (estrada) na década de 1950.
No
quintal da Dona Belinha tinha de tudo um pouco. Até uma fruta estranha, por
nome de kiwi, eu conheci naquele quintal. E ela sempre nos acolhia muito bem. De vez em
quando eu ganhava uma deliciosa maçã. Ficava imaginando que a fruta vermelha e brilhante da história da
Branca de Neve era igual, inclusive no tipo de embrulho, um papel fino e roxo.
A história da Branca de Neve e os sete anões? É! A minha irmã tinha um
disquinho que a gente não se cansava de ouvir, na vitrola das filhas do Almeida (Sueli e Miriam)! Eram paulistanas e para lá voltaram. Nunca mais tivemos notícias.
Quando
chegou a minha adolescência, a Dona Belinha vendeu a sua propriedade. No lugar de
tudo aquilo que me encantava foram surgindo prédios. Tudo aquilo, depois de
pronto, recebeu o nome de Casa Grande. Virou um condomínio chique. Assim é até hoje. “Bote reparo quando
estiver passando por lá”. Quando olho por sobre o muro daquele condomínio e
avisto enormes árvores de fruta-pão, logo penso: “Ainda é plantação da Dona
Belinha”.
Eu
acompanhei toda a obra, fiz amizade com a piãozada toda (Nerso Pinguinha, Odilon Satanás, Osvaldo Capoeira, Zé Paraiba,
Francisco Ceará, Toninho Mineiro, Dito Preto e tantos outros), mas um deles era
especial. Era o Zé do Quepe.
Zé
do Quepe era cearense, da família Bezerra. Na obra, ele era o vigilante e
apontador das horas de trabalho. Andava fardado, de quepe e um cassetete de borracha.Na verdade, ele cuidava do relógio-ponto,
controlando as entradas e saídas do pessoal. Ali todo mundo “era do trecho”,
migrantes que viviam em barracos de obras. O detalhe era que, sempre que estava
mais folgado, o Zé do Quepe ultrapassava o limite da bebida, ficava um bêbado
chorão. Era quando se punha a declamar poesias, recitar trovas dedilhando um
violão muito surrado. Aqui vai uma de pinga que aprendi com ele:
Aguardente
é jiribita Feita de pau de capucho Bate comigo no chão Bato com ela no bucho.
Aguardente
é jiribita, Não há bebida tão boa! Até os padres gostam dela, Quem dirá quem é à toa. Aguardente é jiribita,
Feita de cana crioula... Quem bebe em demasia, Perde a calça e a ceroula.
É essa
gente toda que, convivendo com a gente, levou um pouco de nós e deixou um pouco
deles.
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