domingo, 11 de março de 2018

CUIDADO: URUPÊS MATA CRIANÇA

Orelhas de pau (urupês) num galho seco (Arquivo JRS)


               Nos tempos antigos, os caiçaras - resultantes do caldo cultural de indígenas, africanos e portugueses – se apegavam aos recursos da natureza de forma bem intensa. “O conhecimento que a gente tinha do mato e de tudo ao nosso redor era a nossa salvação”. Eu, trazido ao mundo pela minha vó Martinha, a parteira da região na época onde a única referência em medicamentos industrializados era a Farmácia do Filhinho, no centro da cidade, bem longe do local onde morávamos, certamente estou vivo porque nasci nesse ambiente, rodeado por conhecedores dos poderes, das propriedades das plantas.

               Meus antigos sempre tinham um chá de mato para nos oferecer. Era comum encontrar alguém carregando galhos, raízes e outras partes de plantas para ser usado como remédio. “É canema, meu filho, levo para o Totô que está adoentado. Pela feição dele, sempre aíbo... O coitado deve estar com o ventre cheio de vermes”. Qual dos meus irmãos não se lembra da velha panela da mamãe tampada sobre o fogão, sempre com um chá de alguma coisa para a gente beber durante o dia?

               A minha vó Martinha, por parte de pai, nascida e criada na praia do Pulso, sempre estava acudindo alguém: vivia no leva e trás de mato para fulano e sicrano. Quantas vezes eu não a acompanhei para ir ao mato buscar remédio!?! De foice ao ombro, lá se ia ela e o neto morro acima. Aprendi algumas coisas nessas convivências todas. Me vali em muitas ocasiões, para o meu próprio bem e de outros, desse conhecimento do mundo natural que me acolheu. Ainda me valho! Que bom, né?

               Hoje em dia, num mundo onde as farmácias e propagandas de remédios se tecem e se trombam, os conhecimentos, os saberes tradicionais vão se perdendo. Agora mesmo, por exemplo, me lembrei da tia Carmelina recolhendo urupês no início da década de 1970. Eles abundavam numa amendoeira seca, no jundu da praia da Fortaleza, perto da casa da tia Maria Tereza, onde nós brincávamos com o primo Claudinho. A titia recolheu um tanto daquelas “orelhas de pau” numa cesta de taquara e disse para a vovô Eugênia que a acompanhava: “É para a Maria do Dário, que está com anemia. O trabalho dela, se quiser se curar, é só mastigar e engolir. Depois toma uma caneca de água. Na semana que vem e na outra ela repete isso e pronto, vai se curar. Só as prenhas não devem usar urupês como remédio porque perde a criança. É preciso de ter cuidado então quando usar urupês”.

          "Urupês dá no pau seco, samambaia na umidade;
         É nos corações sinceros que se encontra a amizade".

             Que tal esta quadrinha da minha infância?

               Ah! Minhas reminiscências! Ah! Nossas raízes caiçaras!

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