Orelhas de pau (urupês) num galho seco (Arquivo JRS) |
Nos
tempos antigos, os caiçaras - resultantes do caldo cultural de indígenas,
africanos e portugueses – se apegavam aos recursos da natureza de forma bem
intensa. “O conhecimento que a gente
tinha do mato e de tudo ao nosso redor era a nossa salvação”. Eu, trazido ao mundo pela minha vó Martinha,
a parteira da região na época onde a única referência em medicamentos
industrializados era a Farmácia do Filhinho, no centro da cidade, bem longe do local onde morávamos, certamente estou vivo porque nasci
nesse ambiente, rodeado por conhecedores dos poderes, das propriedades das plantas.
Meus
antigos sempre tinham um chá de mato para nos oferecer. Era comum encontrar
alguém carregando galhos, raízes e outras partes de plantas para ser usado como
remédio. “É canema, meu filho, levo para
o Totô que está adoentado. Pela feição dele, sempre aíbo... O coitado deve
estar com o ventre cheio de vermes”. Qual dos meus irmãos não se lembra da velha
panela da mamãe tampada sobre o fogão, sempre com um chá de alguma coisa para a gente
beber durante o dia?
A
minha vó Martinha, por parte de pai, nascida e criada na praia do Pulso, sempre estava acudindo alguém: vivia no leva e trás de mato
para fulano e sicrano. Quantas vezes eu não a acompanhei para ir ao mato buscar
remédio!?! De foice ao ombro, lá se ia ela e o neto morro acima. Aprendi
algumas coisas nessas convivências todas. Me vali em muitas ocasiões, para o
meu próprio bem e de outros, desse conhecimento do mundo natural que me
acolheu. Ainda me valho! Que bom, né?
Hoje
em dia, num mundo onde as farmácias e propagandas de remédios se tecem e se
trombam, os conhecimentos, os saberes tradicionais vão se perdendo. Agora
mesmo, por exemplo, me lembrei da tia Carmelina recolhendo urupês no início da década de 1970. Eles
abundavam numa amendoeira seca, no jundu da praia da Fortaleza, perto da casa
da tia Maria Tereza, onde nós brincávamos com o primo Claudinho. A titia recolheu um tanto daquelas “orelhas de pau” numa cesta de
taquara e disse para a vovô Eugênia que a acompanhava: “É para a Maria do
Dário, que está com anemia. O trabalho dela, se quiser se curar, é só mastigar
e engolir. Depois toma uma caneca de água. Na semana que vem e na outra ela
repete isso e pronto, vai se curar. Só as prenhas não devem usar urupês como
remédio porque perde a criança. É preciso de ter cuidado então quando usar
urupês”.
"Urupês dá no pau seco, samambaia na umidade;
É nos corações sinceros que se encontra a amizade".
Que tal esta quadrinha da minha infância?
Que tal esta quadrinha da minha infância?
Ah! Minhas reminiscências! Ah! Nossas raízes caiçaras!
Nenhum comentário:
Postar um comentário