Na margem do rio, o grupo escolar de Ubatuba (Arquivo Ubatuba ) |
Uma mulher, ou
melhor, duas senhoras batalhadoras (Olga e Valda) marcaram meus primeiros anos
escolares. Depois, lógico, aprendi muito com a tarefa de outras pessoas que se
dedicaram a ensinar aos caiçarinhas num tempo onde as adversidades eram outras.
Porém, o respeito pelas pessoas e seus ofícios era outro. No caso das escolas
isoladas, onde quem ensinava precisava caminhar bastante, enfrentar travessias
marítimas e conviver junto à famílias caiçaras, havia uma integração marcante:
professora (ou professor) participava das festas e dos momentos angustiantes,
dava a sua contribuição nos encaminhamentos comunitários e vivenciava as mesmas
condições que, geralmente, dependiam do tempo (chuva demais, estiagem
duradoura, ventos fortes...). Ontem, ao ler o relato da Maria Angélica falando
da “Ditinha” da Ilha dos Búzios, reconheço o quanto é importante ter acesso à
escola, poder estudar sobre o mundo, adquirir os conteúdos, os conhecimentos
que proporcionam autonomia. Lembro-me da minha avó dizendo que no tempo dela,
há cem anos ou mais, não havia escola para as meninas. “Só os meninos podiam estudar, meu filho! A sala do tio Onofre era onde
a professora ensinava. Ela morava com eles, era parte da família do titio”.
Ontem pedi
que as crianças escrevessem uma mensagem para uma mulher que elas amassem
muito. Depois do exercício entregue, pedi que imaginassem essa mensagem não
tendo mais destinatário, ou seja, suas mães, tias e outras mulheres admiradas
demais não existiam mais, morreram queimadas numa fábrica com um patrão
terrível, em péssimas condições de seguranças e condições ainda piores de
trabalho (15 horas diárias em condições insalubres, exploração do trabalho
infantil etc.). Elas sentiram então aquilo que eu senti quando a professora
Olga, em 8 de março de 1970, usando a mesma estratégia, nos explicou a História
do Dia Internacional da Mulher, destacando que “as conquistas das mulheres, que alguns ainda não respeitam e nem
valorizam até hoje, está assentada em cima de muitos martírios. Custou vidas
ter melhores condições de trabalho, de leis que garantem direitos e atitudes
respeitosas. Se eu hoje sou professora de vocês, devo isso à sede de justiça e
à convicção que tantas mulheres demonstraram pelo mundo afora em outros tempos”.
Assim, pessoas como as professoras Olga e Valda, muito
importantes na minha infância, ajudaram a desenvolver nos caiçaras daquele
tempo sentimento de respeito, de consideração pelas mulheres. Elevaram a autoestima
de minha mãe e de tantas mulheres simples que enfrentavam as adversidades no
território caiçara. É por isso que me emocionei com a atuação da “Ditinha”,
aquela mulher caiçara que está à frente dos pescadores do arquipélago da
Ilhabela. Imagino quantas exemplares professoras deram a sua contribuição nas
conquistas dessa mulher. Parabéns mesmo! Pobre da pessoa que desconsidera, que
desvaloriza, que não tem nenhum respeito por quem, depois dos pais, é um farol
para nossa rota com dignidade!
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