Na noite passada, durante a Festa de São Pedro, padroeiro dos pescadores, pensei no finado Jean Pierre Patural que, conforme o documento atesta, foi quem fez, em 1956, o primeiro registro na nossa Z-10, a Colônia dos Pescadores.
Para aqueles que, dentro da Colônia dos Pescadores, não acreditam no potencial cultural de uma festa assim (com procissão marítima, barracas, danças típicas, comidas...) para alavancar a suas atividades, eu escrevi este texto reflexivo. Aos demais que fizeram bonito, principalmente no prato típico da tainha, os meus sinceros parabéns.
Em qualquer país é complicado defender
uma pureza cultural. É coisa de atraso na evolução do intelecto. Ou de
fanatismo. Chega a ser doença. Enfim, nunca será saudável e muito menos
coerente, sobretudo em tempos de globalização, ver ou buscar difamar aquele que
não é da nossa cultura. Quem sabe definir tal cultura? Em se tratando de
Brasil, de qualquer rincão ou da moderna capital federal, incluindo aí o nosso
município, quem procede assim é mais incoerente ainda! Afinal, vejamos um exemplo local: até mesmo os indígenas facilmente encontrados na feira, no mercado de peixe, fazendo compras no supermercado... são provenientes de outra região. Só
estão aqui porque o saudoso Lacerda, na década de 1970, executou uma estratégia
de guerrilheiro indigenista. E os tupinambás? Ah! Os tupinambás, que aqui habitavam na época da
chegada dos portugueses, foram condenados à morte na famosa “Paz de Iperoig”,
há mais de trezentos anos. Até mesmo a cultura caiçara é questionada
na atualidade em que os migrantes constituem a maioria absoluta da população e
os jovens naturais daqui sentem vergonha de seus poucos traços culturais,
desconhecem a sua história, etc.
Já publiquei um
trabalho, realizado no final do século passado, sobre o pioneirismo de Jean Pierre
Patural e sua esposa, dona Silvia. Para quem ainda não leu, posso adiantar que eles
tiveram muita coragem para iniciar a vida matrimonial e empreendedora no sertão
da Sesmaria do Ubatumirim, no início da década de 1950, quando sequer se
sonhava com a rodovia Rio-Santos, sendo Ubatuba, conforme dizer do finado
Odócio, “uma casca de saquaritá no cisqueiro lá de casa”, coisa que poucos viam
ou valorizavam. Um desses poucos foi Félix Guisard, da Companhia Taubaté Industrial,
que teve a iniciativa de apresentar ao jovem casal de franceses o quanto este
pedaço de Brasil tinha de promissor, mesmo estando tão isolado, com os caiçaras
que só tinham o “de comê”. Naquele tempo quem queria ver dinheiro migrava para
a labuta nos bananais da Baixada Santista, ou ia morar em Caraguatatuba e
trabalhar na fazenda dos ingleses.
Infelizmente o promissor agrônomo que entendia de tudo um pouco
morreu cedo, quando o bananal começava o ciclo de exportação e seu filho Jean
Pierre acabava de nascer no território caiçara. A Serra do Mar engoliu, junto
com o monomotor montado num quintal de Taubaté, um jovem idealista repleto de
sonhos. O tempo deu um fim ao trator, ao primeiro barco motorizado, e àquele
que ocupa a inscrição número um na nossa Colônia dos Pescadores.
A
terra da família Patural que se transformava numa referência econômica antes do advento do turismo
foi grilada. Hoje, após a morte da dona Silvia, seus filhos (Patrícia está na área da educação e Jean
Pierre no setor pesqueiro) continuam como munícipes em Ubatuba. Assim se fizeram e continuam fazendo pelo Brasil e ao nosso município: através do trabalho e da evolução intelectual. Todo o resto
pode ser classificado como perversidade, atraso da humanidade.