Hoje é aniversário do blog: está completando dois anos. Faço questão de apresentar o texto de alguém muito especial, que acompanha as nossas coisas com muito interesse: o amigo Jorge, da terra de outros Jorges, inclusive o Amado e tantas outras pessoas que fazem este país.
Ubatuba hoje é essa mistura de gente de todas as partes deste Brasil, numa simbiose que vai dando nova feição à cultura local que se refaz entre a serra e o mar.
Aos leitores... Um forte abraço!
“Valeu a pena ter ido morar em Ubatuba?” Essa é uma das perguntas que costumo ouvir quando encontro amigos que deixei em São Paulo. Achavam falta de bom senso deixar um cargo de professor efetivo no município de São Paulo e o cosmopolitismo dessa cidade (Ainda mais, possuindo casa própria e tendo pais, irmãos, outros parentes e amigos por perto.) para “aventurar-se” no litoral.
Eu sempre lhes falava em mudar-me para uma cidade em que pudesse criar meus filhos com mais liberdade e menos preocupação com violência, mas não sabia onde era esse lugar nem me levavam a sério.
Em 1997, vim com Joana, minha mulher - atendendo a um convite de Rui Grilo – a um curso com duração de uma semana, ministrado aqui na EMEI “Maria Alice” por um casal de Volta Redonda. Gostamos tanto de Ubatuba que voltamos para São Paulo com a compra do terreno da casa onde moramos hoje já definida. Vendemos a linha telefônica e o carro para fazer parte do pagamento. Em 98, começamos a construir e, em janeiro de 99, mudamos com a casa só parcialmente terminada. Grande surpresa para meus amigos e parentes.
O primeiro ano foi um pouco difícil financeiramente porque meu salário ficou reduzido a menos da metade. Lá na capital, eu recebia mais da Prefeitura do que Estado, mas, vindo para cá, tive de exonerar-me da rede municipal. Além disso, a maior parte da casa ainda precisava receber acabamento.
Também perdemos a comodidade que tínhamos lá, já que a moça que nos auxiliava em casa não nos acompanhou. Passamos a dar aulas em turnos diferentes para cuidarmos dos quatros filhos. O mais velho tinha só oito anos de idade. Some-se a isso o fato de minha sogra, que veio conosco morar na edícula com meu cunhado, ser cadeirante e requerer, em muitos momentos, a presença da Joana.
Os nossos filhos demoraram a aceitar a mudança. O Henrique, que tinha cinco anos na época, vivia nos perguntando quando voltaríamos para o Brasil. Hoje, quando mencionamos isso em sua presença, ele fica meio encabulado, não só por causa do desconhecimento de Geografia, mas sobretudo porque adora Ubatuba. Ivan Lucas, o mais velho, acostumado a passear com as tias, vivia reclamando da inexistência de shopping e Mc Donalds. Ainda não tinham chegado aqui esses ícones do consumismo. O Caio, que, apesar de, nos primeiros meses, sofrer de alergia a picadas de insetos e por isso ficar com o corpo cheio de perebas, foi o primeiro que viu vantagens em morar em Ubatuba. O mar era seu trunfo para argumentar com seu irmão gêmeo: “Ah, Henrique, lá só tem uma aguinha”. Dizia, referindo-se à pequena piscina de plástico que tinham em São Paulo contra a imensa praia do Perequê-Açu.
O Ivan Lucas logo começou a ir à escola sozinho, de bicicleta. Depois os outros, à medida que iam crescendo, ganhavam autonomia, e essa possibilidade de poderem andar sozinhos na cidade foi fundamental no desenvolvimento deles. Uma vez que não precisavam de ser levados para os cursos, puderam ter aulas de natação na piscina municipal, de capoeira, desenho, dança, teatro, circo, música, na Fundart, inglês na BP English. Se, nessa época, morássemos ainda em São Paulo, eles só poderiam sair para a escola e para as atividades extraescolares acompanhados de um adulto, o que seria inviável. Hoje há três deles morando fora do município por contingências da vida, mas amam Ubatuba. Se não tivessem necessidade, não sairiam daqui.
Em 2001, assumi o cargo de professor na rede municipal, para o qual eu tinha feito concurso no ano anterior. Fui trabalhar na EM “José Belarmino”, no Puruba. Fiquei lá até 2010. Os alunos eram bastante dóceis e amáveis. O grupo de professores e funcionários também era muito acolhedor e amigo. Sentia-me em casa. Ademais, eu ia para o trabalho vendo da janela do ônibus o sol surgir dourando as águas do mar e a folhagem da Mata Atlântica. No retorno, ao meio-dia, meus olhos queriam manter-se voltados para o mar azul, salpicado de ilhotas verdes e ondas brancas, mas a cada curva eram atraídos pelo colorido da Serra do Mar com suas quaresmeiras, seus manacás e numerosas outras plantas que matizam com suas flores o verdor da mata. Era uma viagem. Viagem extasiante.
O melhor de tudo é que a todas essas coisas positivas que relatei soma-se uma numerosa quantidade de excelentes amigos que temos feito aqui. Por tudo isso, sempre respondo com convicção àquela pergunta de meus amigos da capital. Sim, valeu a pena ter vindo morar em Ubatuba.
Jorge Ivam Ferreira