Apelo infantil - Arquivo JRS |
Uma capa de anos - Arquivo JRS |
Em muitos momentos da minha história eu presenciei pessoas aparentemente sossegadas, mas armadas de ideias perigosas. Parece que ainda ouço alguns dos caiçaras de outros tempos comentando em voz baixa a ditadura que se instalou no meu país quando eu era criança e nem sabia falar. Então chegou o momento de eleições municipais, quando um veterano e um jovem disputaram a prefeitura. Os comentários gerais eram de que era hora de renovar, que o mais velho deles não podia apresentar nada de novo, estava alinhado com o sistema e o grupo dominante etc. Ganhou o jovem, mas não demorou nada e logo estava rumando para um cargo em Brasília. Decepção. “Não era um subversivo”. Ou foi cooptado?
Mais tarde, a polarização entre dois partidos. A ditadura queria parecer democrática, mas continuava torturando gente, perseguindo os opositores. Por aqui, em Ubatuba, pessoas da linha de frente e muita gente anônima também se reunia, protestava, pensava em como sair daquela enrascada histórica e voltar ao trilho democrático. Meu pai acompanhava Idílio Barreto, do MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Mamãe permitia que eu os acompanhasse em encontros que tratavam de política. Me recordo bem de uma dessas reuniões ocorrida numa noite, na praia da Tabatinga. Muitos pescadores e roceiros presentes escutaram e tomaram posições. As mulheres não estavam ali. A maioria dessa caiçarada não ganhou nome na história, mas tenho certeza que seus votos apressaram o fim daquele período de trevas.
Graças a essa vida de aprendizado, de escutar e de ler assuntos significativos, eu e mais gente da minha geração soubemos apoiar causas mais coerentes com a nossa história. Vieram as Comunidades Eclesiais de Base, vieram os partidos políticos lutando contra as desigualdades sociais e pelos direitos dos trabalhadores, veio o Movimento dos Sem Terra, veio o Movimento em Defesa de Ubatuba etc. Vieram as questões filosóficas preocupadas em incluir mais gente para a felicidade. Pensamentos assim solidificaram nossas crenças em desconstruir para reconstruir. Passei a usar esta frase: “O mundo não nasceu assim. Nós o fizemos desse jeito. Logo, podemos refazer de outro jeito”.
Por tudo isso, digo que se fixou em mim a fé na democracia. Assim, neste dia de eleições gerais no Brasil, meu voto é para não deixar vencer os protagonistas daquele período de ditadura que tão negativamente marcou a minha infância e juventude. Percebo que esse pessoal das trevas se vale da ignorância dos mais simples, dos que não desenvolvem uma reflexão coerente com a vida que lhe é imposta, se alienam e se vendem a troco de migalhas. É pobre querendo perder mais direitos, mulheres aprovando o machismo e a violência, religiosos vestindo pele de lobo, mas se passando por cordeiro etc. Aonde vamos? Voto é força, minha gente! (Observação: Não esquecer de cultivar ideias subversivas, capazes de mudar a ordem que aí está. Não esquecer, sobretudo, da sua classe social e da sua origem). Finalmente, agradeço muito às pessoas que, desde a minha infância, deram sua contribuição neste meu ser democrático que deseja evoluir!
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